segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Eu sou palavroso? Dificuldades de um escritor para públicos distintos!

Sou professor de administração há mais de 30 anos, para ser mais exato, em agosto desse ano completei 33 anos de atuação no ensino e pesquisa em Administração. Entre 1977 e 1981, enquanto fazia minha graduação em Administração na Universidade Estadual de Londrina, publiquei algumas crônicas e pequenos textos em uma seção da Folha de Londrina que era editada pela jornalista Ana Aromatário. A seção tinha o título de “Qual é a deles?” e destinava-se à publicação de textos de leitores do jornal. Não era uma seção de cartas do leitor! Mas, uma seção em que muitos leitores escreviam sobre temas que lhes interessavam. Publiquei algumas vezes nessa seção. Eram textos não acadêmicos, mas em alguns deles tratei de questões relacionadas á Administração. Muitas vezes recebi comentários elogiosos sobre o que escrevi naquela época.
Depois de concluir meu mestrado na Faculdade de Economia e Administração comecei minha carreira de escritor acadêmico. Meu primeiro texto científico foi publicado na revista Temática – Estudos de Administração, em 1984, quando escrevi sobre a relação entre ecologia de empresas e fomento econômico. A Temática foi uma publicação do Departamento de Administração da UEL que deixou de existir. Dois anos depois, publiquei um artigo na Revista de Administração da USP, no qual relatei estudo feito sobre atividades de apoio à pequena empresa no Reino Unido. Desde essa época, peguei gosto pela pesquisa e publicação acadêmicas. Nesses trinta anos, foram mais de cinquenta artigos de cunho acadêmico/científico! Uma boa produção que tem sido referenciada por outros estudiosos. Isto me deixa muito feliz!
Mais recentemente, por meio desse blog, voltei à escrita menos acadêmica ou menos científica. Aqui tenho registrado minhas reações e comentários a temas que estudo na Administração, mas tenho evitado ser muito rigoroso em termos científicos. Esse é o espaço para minhas emoções se juntarem ao uso da razão. Alguns dos textos que aqui publiquei têm me causado muito mais prazer do que trabalhos acadêmicos que são muito importantes em minha carreira de pesquisador. É outra forma de expressão!
Mas, às vezes, tento misturar os estilos em uma mesma publicação. No ano passado, por exemplo, graças à compreensão de seus editores, publiquei um texto na edição inaugural da Organizações e Sustentabilidade (http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/ros/article/view/15798) no qual teci reflexões sobre sustentabilidade e responsabilidade social corporativa a partir do cinema. Escrever o parágrafo inicial desse texto foi um momento quase mágico para mim. Sem nenhuma falsa modéstia, sugiro que você dê uma olhada nesse texto.
A regra geral que tenho seguido, no entanto, é tentar adequar o estilo à publicação, ou seja, ao seu público. Foi o que pensei estar fazendo quando, dois meses atrás, ajudei Sara a descrever um estudo de caso sobre capital social e empreendedorismo em um texto que submetemos a uma conferência sobre empreendedorismo que acontecerá na Espanha no próximo mês. Meu julgamento foi que estávamos preparando um texto para uma reunião acadêmica ou científica. Seguimos o script da produção de um texto acadêmico. Introdução, desenvolvimento e conclusão bem articuladas por uma boa base teórica e descrição cuidadosa dos procedimentos do estudo. Na conclusão reforçamos o que o caso nos ensinou sobre essa relação. Mas, parece que me enganei. Como descobri isso?
Ontem recebi o resultado da avaliação do trabalho. Ele foi aceito para apresentação no evento. Infelizmente, como o anúncio da aprovação veio um pouco tarde, Sara e eu não poderemos participar da conferência. Eu ia tentar levantar recursos para custear minhas despesas de viagem. A parte de Sara seria coberta por nós. Mas, não há mais tempo para isso junto aos órgãos de fomento brasileiros. Assim, tivemos que desistir da participação e da publicação do trabalho.
A essa altura você deve estar se indagando:
_ Se o trabalho foi aceito, onde está o engano?
Pois é meu caro leitor ou minha cara leitora, apesar de bem sucedido, descobri que a linguagem não estava adequada ao público pelo comentário que o(a) avaliador (a) fez sobre o nosso texto. Eis o comentário:
Bem, julgo que o artigo é de aceitar. Porém, parece-me, em geral demasiado palavroso. Apesar, disso, acho que a maior parte do conteúdo é, já, aceitável.
A única secção que, creio eu, deve ter uma modificação é dedicada à revisão bibliográfica. Parece-me claramente demasiado extensa. A meu ver, deve ser reduzida ao mínimo indispensável - conter apenas o que esteja diretamente ligado ao estudo de caso em causa.
O que é dito nas restantes seções poderia ser dito em menos palavras e de uma forma mais clara. Porém, do meu ponto de vista, tem já qualidade suficiente.
Ora veja você! Parece que Sara e eu não precisávamos ter dedicado tanto esforço a demonstrar a relação do caso estudado com a literatura e tampouco discutir o que o caso trouxe de novo para o entendimento da relação entre capital social e empreendedorismo. Parece-me que era esperada apenas a descrição de um caso prático bem sucedido. Erramos no estilo, mas acertamos no alvo: o trabalho foi aprovado!
Só fiquei um pouco chateado de ter sido adjetivado como palavroso! Sabe o que isso quer dizer no português brasileiro? Prolixo! Eu podia ter ido dormir sem essa ontem à noite!
Ah! Outra coisa:
_ Espero não ter sido palavroso nesse post!

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Capital social ou conexões: juntanto reflexões acadêmicas com empreendedoras

Minha atenção de pesquisador na área do empreendedorismo foi atraída por um tema que já foi objeto de estudo de muitos aqui no Brasil e no exterior: o capital social empreendedor. Minha primeira aproximação a esse tema deu-se quando Sara e eu realizamos um pequeno estudo sobre a criação de uma empresa de cicloturismo em Curitiba - a KuritBike Cicloturismo Urbano (http://novo.kuritbike.com/). A partir de uma entrevista com o criador da KuritBike, procuramos identificar como esse empreendedor usou sua rede de contatos para obter acesso a recursos necessários para a criação e manutenção de sua empresa no mercado. De forma muito resumida, o capital social empreendedor diz respeito aos contatos que um empreendedor ou uma empreendedora utiliza no sentido de obter acesso a recursos (financeiros, informacionais, materiais, de conhecimento, etc) que facilitem o surgimento da empresa em primeiro lugar e, depois, sua permanência bem sucedida no espaço competitivo que é o mercado.

Há uma literatura grande sobre esse tema, mas hoje quero falar de um texto que meu amigo Cândido Borges escreveu em co-autoria com o professor Louis Jacques Filion e que foi publicado no número 1 do primeiro volume da Revista de Empreendedorismo e Gestão de Pequenas Empresas - REGEPE (http://www.regepe.org.br/index.php/regepe/article/view/12). No artigo Evolução do capital social empreendedor dos spin-offs universitários, Cândido e Filion descrevem o resultado de uma pesquisa com oito empresas que tiveram sua origem ligada a alguma instituição de ensino superior, mostrando como o capital social de seus empreendedores foi se tornando cada vez mais diversificado e numeroso conforme as empresas progrediam nas etapas de sua criação. Nesse texto, os dois pesquisadores adotam um modelo que divide a criação de uma empresa em quatro estágios distintos: iniciação, preparação, lançamento e consolidação. 

O trabalho de Cândido e Filion é uma excelente introdução ao tema do capital social empreendedor. Recomendo sua leitura a quem quer começar uma jornada de estudos nesse campo do conhecimento. Além disso, o artigo tem uma escrita de excelente qualidade, tanto do ponto de vista científico quanto do ponto de vista de capacidade de comunicar claramente seus resultados!

Nessa minha vida que junta atividades de professor, pesquisador e gestor, em paralelo aos meus estudos, continuo minhas funções como Coordenador de Empreendedorismo e Incubação de Empresas da Agência de Inovação UFPR. No momento, tenho dedicado muito esforço na condução do curso de extensão Bota pra Fazer, em parceria com o Instituto Endeavor Brasil, destinado à capacitação de estudantes da Universidade Federal do Paraná, cujo objetivo é fazer com que os participantes sejam capazes de se reconhecer como potenciais empreendedores e auxiliá-los no desenvolvimento de sua capacidade empreendedora, na identificação de oportunidades para empreender e na elaboração de um plano de negócio que leve, eventualmente, à criação de uma nova empresa.

Assim, estou revendo o conteúdo desse curso, um pouco a cada dia, visando me preparar para poder conversar com os alunos sobre seu conteúdo e esclarecer eventuais dúvida. Hoje, tive a oportunidade de assistir um vídeo com o depoimento do Marcelo Sales, que faz parte do conteúdo do curso, cujo título é As conexões que movem a vida. Esse vídeo está disponível no seguinte site: https://www.youtube.com/watch?v=JR7Omeoatek.

Marcelo Sales, mais que empreendedor bem sucedido, é um comunicador nato e faz um depoimento cheio de graça e simpatia, além, é claro, de compartilhar muito conhecimento útil para potenciais empreendedores. Foi muito legal poder aprender com ele sobre como sua rede de contatos (conexões) foi importante na construção de seu sucesso empreendedor ao longo de vários momento de sua vida.

A ligação entre o artigo de Cândido e Filion com o depoimento de Marcelo Sales surge fortemente nos trechos em que Marcelo Sales conta sobre as conexões que buscou no mundo dos negócios quando queria tornar efetivas as ideias empreendedoras que tinha junto com seus sócios. Muito legal poder ver como a experiência desse empreendedor é mais um exemplo de que a conclusão do estudo de Cândido e Filion faz todo o sentido, ou seja, para esses autores, o capital social empreendedor passa de uma rede majoritariamente tecnológica a uma rede mais diversificada, que inclui todas as categorias de rede (de suporte, de financiamento e outras) e uma composição contando proporcionalmente com cada vez mais contatos de negócio. 

Leiam o texto e vejam o vídeo ou vejam o vídeo e leiam o texto. Se aprende muito com ambos!

P.S.: O estudo que Sara e eu realizamos será submetido a algum periódico e espero que um dia esteja disponível para leitura.