Desde
2008, foi instituído no Brasil a figura do microempreendedor individual.
Daniela Torres da Rocha e eu estivemos envolvidos em um estudo recente sobre a
economia da cultura no Brasil. Nesse post, faço uma breve descrição da presença
de microempreendedores individuais nas atividades culturais do Brasil. Pretendemos
escrever um artigo analisando de forma mais detalhada a dinâmica da economia da
cultura brasileira, mas achei que essas informações preliminares poderiam
interessar a outras pessoas.
Entre
alguns dados que levantamos, nos chamou a atenção o crescimento do número de
microempreendedores individuais em diversos segmentos relacionados às
atividades culturais no Brasil. Dados consolidados sobre a economia da cultura
no Brasil não são facilmente encontrados. Em 2010, o Ministério da Cultura
divulgou um relatório denominado “Cultura em Números” no qual é possível
encontrar um panorama amplo sobre o setor cultural brasileiro, inclusive com
dados sobre sua relevância econômica. A maioria dos dados disponibilizados são
referentes aos anos de 2005 e 2006. Em 2006, as empresas culturais privadas no
país representavam 5,7% do total de empresas. Quando se restringe a análise ao
setor de serviços, as empresas culturais representavam 11,1% das empresas
prestadoras de serviços no Brasil. Em termos de setores econômicos, as empresas
culturais eram, em sua maioria, empresas de serviços (61,4%), com 25,1%
participando da indústria de transformação e 13,5% têm natureza comercial.
Esses números revelam a importância da economia da cultura na economia
brasileira.
De
igual forma, a participação do setor da cultura em relação à geração de emprego
e renda é significativa para o Brasil. As atividades culturais eram
responsáveis por 4,1% do pessoal ocupado e 5,3% dos salários e outras
remunerações, com um número médio de empregados por empresa igual a 5. A
maioria das empresas do setor cultural era de micro e pequeno porte com 97,5%
empregando menos que 20 pessoas. Segundo dados do IBGE, em 2010, no Brasil
havia 2.102.698 pessoas ocupadas em atividades culturais, das quais 70% na
condição de assalariados.
A
partir de informações disponibilizadas pelo Serviço Brasileiro de Apoio às
Micro e Pequenas Empresas – SEBRAE (http://www.facebook.com/l.php?u=http%3A%2F%2Fsistema.datasebrae.com.br%2F%23sebrae&h=_AQGXuzfP),
foi possível identificar o tamanho dos diferentes segmentos culturais no
período entre 2009 e 2013. Essa base de dados oferece, entre outras
informações, a quantidade de empresas segundo a Classificação Nacional de
Atividade Econômica (CNAE). As empresas são classificadas pelo porte em cinco
categorias: Grande (G), Média (M), Pequena (P), Micro (Mi) e Microempreendedor
Individual (Mei).
Com
base nas informações coletadas foi possível identificar 68 atividades
empresariais que foram consideradas parte da economia da cultura. Estas são
listadas no quadro 1.
Quadro
1 – Atividades empresariais integrantes dos
segmentos culturais
Segmento
|
Atividades
|
Artes
Cênicas
|
Aluguel
de palcos, coberturas e outras estruturas de uso temporário, exceto andaimes;
Artes cênicas, espetáculos e atividades complementares não especificados
anteriormente; Ensino de artes cênicas, exceto dança; Ensino de dança; Gestão
de espaços para artes cênicas, espetáculos e outras atividades artísticas;
Produção de espetáculos circenses, de marionetes e similares; Produção de
espetáculos de dança; Produção de espetáculos de rodeios, vaquejadas e
similares; e Produção teatral.
|
Artes
Visuais e Eletrônicas
|
Atividades
de produção de fotografias aéreas e submarinas; Atividades de produção de
fotografias, exceto aérea e submarina; Comércio varejista de objetos de arte;
Construção de obras-de-arte especiais; Ensino de arte e cultura não
especificado anteriormente; Fabricação de chapas, filmes, papéis e outros
materiais e produtos químicos para fotografia; e Laboratórios fotográficos.
|
Audiovisual
|
Aluguel
de fitas de vídeo, DVDs e similares; Atividades de exibição cinematográfica;
Atividades de pós-produção cinematográfica, de vídeos e de programas de
televisão não especificadas anteriormente; Atividades de produção
cinematográfica, de vídeos e de programas de televisão não especificadas
anteriormente; Atividades de rádio; Atividades de televisão aberta;
Atividades relacionadas à televisão por assinatura, exceto programadoras;
Comércio atacadista de filmes, CDs, DVDs, fitas e discos; Comércio varejista
de artigos fotográficos e para filmagem; Comércio varejista de discos, CDs,
DVDs e fitas; Distribuição cinematográfica, de vídeo e de programas de
televisão; Estúdios cinematográficos; Fabricação de aparelhos de recepção,
reprodução, gravação e amplificação de áudio e vídeo; Fabricação de aparelhos
fotográficos e cinematográficos, peças e acessórios; Operadoras de televisão
por assinatura por cabo; Operadoras de televisão por assinatura por micro-ondas;
Operadoras de televisão por assinatura por satélite; Programadoras;
Reprodução de vídeo em qualquer suporte; Serviços de dublagem; e Serviços de
mixagem sonora em produção audiovisual.
|
Humanidades
|
Atividades
de bibliotecas e arquivos; Comércio atacadista de livros, jornais e outras
publicações; Comércio varejista de jornais e revistas; Comércio varejista de
livros; Edição de jornais diários; Edição de jornais não diários; Edição de
livros; Edição de revistas; Edição integrada à impressão de jornais diários;
Edição integrada à impressão de jornais não diários; Edição integrada à
impressão de livros; Edição integrada à impressão de revistas; Impressão de
jornais; Impressão de livros, revistas e outras publicações periódicas;
Representantes comerciais e agentes do comércio de jornais, revistas e outras
publicações; e Serviços de pré-impressão
|
Música
|
Atividades
de gravação de som e de edição de música; Comércio varejista especializado de
instrumentos musicais e acessórios; Ensino de música; Fabricação de
instrumentos musicais, peças e acessórios; e Produção musical
|
Patrimônio
Cultural
|
Atividades
de museus e de exploração de lugares e prédios históricos e atrações
similares; Restauração de obras de arte; e Restauração e conservação de
lugares e prédios históricos
|
Produtos
e Serviços para atividades culturais e outras atividades culturais
|
Agenciamento
de profissionais para atividades esportivas, culturais e artísticas;
Atividades de artistas plásticos, jornalistas independentes e escritores;
Atividades de jardins botânicos, zoológicos, parques nacionais, reservas
ecológicas e áreas de proteção ambiental; Discotecas, danceterias, salões de
dança e similares; Fabricação de mídias virgens, magnéticas e ópticas;
Parques de diversão e parques temáticos; e Reprodução de som em qualquer
suporte
|
Fonte:
Sebrae, 2016.
Estas
informações permitiram descrever a evolução da economia da cultura no período
de cinco anos. No período 2009/2013, o número de empresas da economia da
cultura como um todo teve um crescimento de 159%, passando de 79.302 empresas em
2009 para 205.524 em 2013.
Esta
taxa de crescimento foi diferente para cada porte de empresa. O número de
grandes empresas teve um crescimento muito baixo (16%). As médias empresas
tiveram uma redução de 8% nos cinco anos. O crescimento das pequenas empresas
foi de 22% e o das Microempresas atingiu 26%. O destaque nesse período é o
crescimento do número de Microempreendedores Individuais. Nesse período, o
número de MEIs passou de apenas 1.245 em 2009 para 108.396 em 2013, o que
significou um crescimento de 8.606%. Esse dado revela que a economia da cultura
tem um predomínio acentuado de empreendimentos que envolvem um número muito
pequeno de pessoas, visto que a figura do MEI, além do indivíduo empreendedor,
permite a contratação de apenas mais um empregado.
Essa
dinâmica de crescimento se evidencia ainda mais quando se analisa a
participação proporcional de cada porte no número de empresa. Em 2009, as
atividades empresariais culturais tinham uma presença majoritária de microempresas
(79,60%) e pequenas empresas (16,08%). Ao longo dos anos, ao passo que a
participação de MEIs foi aumentando, a dessas duas categorias foi diminuindo.
Assim, em 2013, os MEIs representaram mais da metade dos empreendimentos
culturais, ficando as Microempresas com 38,64% do total. Esses dados estão
sintetizados na tabela 1.
Tabela
1 - Número de empresas da economia da cultura
por porte (2009-2013)
Ano
|
G
|
%
|
M
|
%
|
P
|
%
|
Mei
|
%
|
Mi
|
%
|
Total
|
2009
|
292
|
0,37
|
1.893
|
2,39
|
12.748
|
16,08
|
1.245
|
1,57
|
63.124
|
79,60
|
79.302
|
2010
|
315
|
0,28
|
2.255
|
2,00
|
16.067
|
14,28
|
20.809
|
18,50
|
73.065
|
64,94
|
11.2511
|
2011
|
320
|
0,23
|
2.374
|
1,74
|
17.005
|
12,47
|
45.915
|
33,67
|
70.750
|
51,88
|
136.364
|
2012
|
347
|
0,21
|
1.714
|
1,02
|
14.267
|
8,48
|
76.491
|
45,48
|
75.381
|
44,82
|
168.200
|
2013
|
341
|
0,17
|
1.740
|
0,85
|
15.627
|
7,60
|
108.396
|
52,74
|
79.420
|
38,64
|
205.524
|
Fonte:
Dados Sebrae, 2016.
Essa
dinâmica foi reproduzida em cada um dos agrupamentos de atividades empresariais
apresentados acima. Mas, com algumas pequenas diferenças quando se analisa
os números de 2013.. No segmento das
Artes Cênicas havia uma presença majoritária de microempresas e microempreendedores
individuais, 53,9% e 33,4% do total de empreendimentos, respectivamente. Por
outro lado, nas Artes Visuais e Eletrônicas os microempreendedores Individuais eram
79,7% dos empreendimentos, enquanto que a participação de Microempresas foi de
18,0%. No setor de audiovisual, as microempresas eram pouco mais da metade dos
empreendimentos (51,2%) e os micro empreendedores individuais foram 37,3%. A diferença
de proporção de microempresas e microempreendedores individuais nas Humanidades
foi menor, 47,77% e 39,94%, respectivamente. As atividades
relacionadas à Música eram também predominantemente exercidas por micro
empreendedores (70,13%), seguidos por microempresas (24,93%). O mesmo ocorreu
com os empreendimentos do setor de Patrimônio Cultural: microempreendedores
individuais foram 78,77% com 17,99% de microempresas. Por fim, no grupo
composto por empresas de Produtos e Serviços para atividades
culturais diversas e outras atividades, a presença majoritária foi de
microempresas (79,94%) e apenas 1,45% de microempreendedores individuais.
Uma pergunta que pode
ser interessante tentar responder diz respeito ao que levou a esta situação? Foi
um movimento de formalização de muitos envolvidos com atividades culturais que
atuavam na economia informal? Foi uma criação forçada de microempreendedores
individuais por uma dinâmica de “terceirização” imposta por empregadores dos
diversos setores da economia da cultura brasileira? Ou uma combinação dessas
alternativas? Não temos essa resposta, mas um levantamento de motivações para a
formalização de microempreendedores individuais na cultura seria uma forma de responde-la.
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