quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Nitis Jacon, uma empreendedora cultural

Passando férias em São Francisco do Sul, na casa de minha irmã Kilda. Dias atrás, encontrei um livro escrito por Nitis - Memória e Recordação Festival Internacional de Londrina - 40 anos. Nele, uma dedicatória de Nitis para Kilda. Sem data. Me apaixono pelo relato de Nitis e decido, após sua leitura, escrever esse post. Foram mais de 40 dias sem visitar meu blog. No segundo semestre do ano passado, alías, andei afastado de meus blogs. Escrevi muito. Mas, foram escritos mais técnicos, guiados por um estilo mais formal. Em férias, deixo a imaginação e emoção me guiarem. Inspirado pelo relato de Nitis, quero registrar a minha percepção dela enquanto empreendedora cultural à frente do Festival Internacional de Londrina (FILO)
Me vem â mente, meu primeiro escrito sobre o tema. Foi, também, inspirado por uma mulher. Uma cineasta. Registrei minha reação às palavras de Lucia Murat quando, alguns anos atrás, em maio de 2013, ao assistir a sua palestra em Curitiba, antes da exibição do making of do filme A memória que me contam, inspirei-me na possibilidade dela ser vista como empreendedora cultural. Isto foi registrado no post http://3es2ps.blogspot.com.br/2013/05/a-pequena-empresa-como-espaco.html.
Fui professor da Universidade Estadual de Londrina durante 17 anos. Entre 1981 e 1998, tive a oportunidade de ver muitas apresentações teatrais que aconteciam anualmente nas edições do FILO. Era inevitável ver a figura marcante de Nitis durante as realizações do FILO. Todavia, nunca fomos próximos. Eu admirava o trabalho que ela realizava, mas como professor do Departamento de Administração havia poucas chances de contato com ela. Ademais, minha timidez impedia uma aproximação a esta mulher forte. O que podia eu falar a alguém que fazia tanto?
Compromissos universitários acabaram nos levando a conviver, ainda que por períodos curtos. Certa vez, eu era chefe do departamento e Nitis, como vice-reitora, foi à abertura de um evento de nosso curso. Naquele dia, usei uma metáfora sobre o cinema para falar sobre o ensino de Administração. Nitis reforçou minha metáfora usando a poesia em sua fala. Foi um momento em que,juntos, misturamos razão e emoção.
Lembro-me de um encontro com Nitis, também quando era vice-reitora da UEL e eu, por apenas seis meses, fui coordenador de ensino de graduação da UEL. Este era um cargo semelhante a Pro-reitor que na estrutura administrativa da UEL tinha um nome diferente. Portanto, segundo escalão. Eu fora convidado pelo reitor Jackson Proença Testa para assumir esta função devido ao falecimento do Professor Abdo, que era o coordenador anterior. Logo no começo, certo dia, eu estava chegando para trabalhar na minha sala da CAE e Nitis me abordou no estacionamento. Veio me abraçar e dizer que estava muito feliz por minha indicação para o cargo. Ela ficara curiosa em saber quem eu era e descobrira que era irmão de Kilda. Minha irmã, também professora na UEL, auxiliava nas atividades do FILO na condição de tradutora e intérprete para os convidados estrangeiros por meio de seu domínio da lingua inglesa de que era professora. Minha curta estadia na CAE me aproximou um pouco de Nitis. Alguns anos depois, quando ela foi presidenta do Centro Cultural Teatro Guaíra, entre 2003 e 2005, eu estava em Curitiba como diretor de Administração da Fundação Araucária. Tivemos a oportunidades de nos encontrarmos algumas vezes. Caminhos idferentes, acabaram nos afastando geograficamente. Fiquei em Curitba e ela voltou para o norte do Paraná.
O empreendedorismo cultural tem me atraído recentemente. É um tema de estudo que me cativa devido ao que chamo de dupla lógica de atuação. Aquelas(es) que empreendem culturalmente, ao mesmo tempo em que seguem uma lógica criativa nas suas ações, precisam desenvolver, também, habilidades de negócios, visto que seus empreendimentos culturais estão imersos em uma sociedade capitalista e dependem de recursos financeiros. É um campo de ação onde emoção e razão convivem diuturnamente. É um processo contínuo de construção de uma identidade empreendedora, em que o sentimento de realização vem de uma capacidade de se comunicar criativamente de forma a atingir metas artísticas e viabilidade econômico-financeira.
No livro de Nitis encontrei um relato sincero em que as emoções, frustrações, alegrias, desejos, dúvidas e dívidas foram os personagens ocultos de um drama que se repete anualmente, quase sempre com final feliz. O que vi foi um relato que reforçou minha crença na noção de que o empreendedorismo, em geral, e o cultural, em particular, é uma maneira que temos de nos expressar para o mundo. Seja nos seus estágios iniciais, quando o empreendimento está se formando, seja mais tarde quando este se estabiliza, mas, paradoxalmente, demanda ajustes contínuos, algumas mudanças, inovação e transformação, os que empreendem parecem afirmar: é isso o que eu enxergo e assim que quero participar desse mundo!
Foi isto que vi Nitis fazendo, nos momentos em que pude ser espectador do FILO e lendo, nesses dias, o livro de Nitis. Para finalizar, reproduzo trecho de uma carta escrita por Nitis ao governador do estado em 1996, em que ela, a meu ver, sintetiza o que quero dizer quando a qualifico como empreendedora cultural:
"Todos os anos, inevitavelemente, sofro a angústia da imponderabilidade do acaso e da concretude dos obstáculos que configuram a incerteza de que, afinal, o Festival acontecerá mais uma vez. Choro, me lamento, rodo a baiana, chuto o pau da barraca, imagino crimes hediondos nas minhas noites de insônia... Depois, na abertura do festival, esqueço tudo e agradeço. Agradeço a deus e ao diabo..." (p. 349).
Lindo de viver!

Referência: Jacon, Nitis. Memória e Recordação Festival Internacionla de Londrina. - 40 anos. 2010.

2 comentários:

  1. Amei Fernando! Acho fantástica a saga dos empreendedores culturais, quer seja em teatro, cinema, festivais, semana de moda, exposições, dança, música, museus etc....
    Sugiro que, numa outra vertente de atuação, leia sobre OCTAVIO DE MOURA ANDRADE. Este empreendedor e o irmão fundaram a cidade de ANDRADINA, e ele OCTAVIO foi responsável pelo planejamento, implementação e fundação do município de Águas de São Pedro.

    ResponderExcluir
  2. Com 17 anos, tive a oportunidade de ser aluno da Nitis em um curso de coreografia e ocupação de espaços cênicos. Penso o mesmo, uma mulher tão forte que chegava a amedrontar. (Admir)

    ResponderExcluir