O
tema do empreendedorismo cultural tem me atraído nos últimos anos. Minha
primeira aproximação se deu quando, ao preparar um trabalho de conclusão de
curso de especialização em Cinema, relatei minha experiência com a criação da
Revista Livre de Cinema. Este texto, com algumas modificações, foi publicado em
formato de artigo na Revista de Empreendedorismo e Inovação Sustentáveis (http://revista.isaebrasil.com.br/index.php?journal=revise&page=article&op=view&path%5B%5D=7&path%5B%5D=GIMENEZ-v1n12016).
Antes
desse artigo, embora eu não tenha usado o termo empreendedorismo cultural, esta
noção surgiu de forma embrionária em meu modelo mental sobre o empreendedorismo
quando comentei a palestra dada por Lucia Murat em Curitiba no post A pequena empresa como espaço expressivo do
empreendedor (http://3es2ps.blogspot.com/2013/05/a-pequena-empresa-como-espaco.html).
Nesse momento, enxerguei a cineasta como uma empreendedora, ao mesmo tempo em
que avançava a ideia de que empreender pode ser visto como um ato de expressão
para o mundo, ou seja, um momento de criatividade. Ora, os empreendedores
culturais são o tipo de empreendedor onde essa vontade de se expressar para o
mundo se manifesta cotidianamente em suas manifestações culturais.
Desde
então, tenho refletido sobre o tema e, vez ou outra, escrevo algo. Uma das
questões que tenho intenção de explorar de forma mais aprofundada se relaciona
com a identidade empreendedora dos que empreendem no campo da cultura. Por ser
um campo de atuação que envolve a constante aplicação de processos criativos,
ao mesmo tempo em que, demanda o domínio de uma lógica de articulação de
recursos de forma sustentável, independente da natureza lucrativa ou não das
ações empreendedoras nesse campo, penso que o empreendedorismo cultural pode
gerar um conflito existencial naqueles que empreendem no campo.
Assim,
pode ser que os atores desse campo não se sintam muito confortáveis quando são
identificados como empreendedores. Por exemplo, em janeiro deste ano, publiquei
outro post em que falo de Nitis Jacon como uma empreendedora cultural (http://3es2ps.blogspot.com/2018/01/nitis-jacon-uma-empreendedora-cultural.html).
Não sei se Nitis concordaria com esta qualificação, mas tenho certeza que sua
trajetória profissional, especialmente à frente do Festival Internacional de
Londrina, é um ótimo exemplo de empreendedorismo cultural.
No
ano passado, publiquei um livro com os resultados de levantamento que fiz sobre
a produção brasileira no campo do empreendedorismo disseminada na forma de
artigos. Criei também uma tipologia de temas de pesquisa no campo do
empreendedorismo brasileiro. O empreendedorismo cultural é um campo que surgiu
recentemente e ainda não tem uma produção numerosa. O livro pode ser acessado
em (https://www.dropbox.com/s/8bayerejmtevqpv/Empreendedorismo%20-%20uma%20bibliografia%20de%20artigos%20publicados%20em%20peri%C3%B3dicos%20brasileiros.pdf?dl=0).
Neste
momento, desejo comentar sobre dois empreendimentos culturais que conheço. Um
deles de Curitiba, que conheçi há alguns anos. O outro é de São Paulo, que pude
visitar dias atrás. São empreendimentos em campos distintos, literatura e
teatro, mas demonstram, em minha percepção alguns aspectos dessa dualidade que
é empreender no campo da cultura.
Há
alguns anos, conheci o Jornal Relevo que encontrei em uma biblioteca.
Distribuído gratuitamente, ele existe desde setembro de 2010. Conforme descrito
em sua página no Facebook (https://www.facebook.com/pg/jornal.relevo/about/?ref=page_internal),
é um impresso mensal de cultura, sobretudo de literatura, editado pelo
jornalista Daniel Zanella. Uma das coisas que me chamou a atenção, além do
conteúdo do Relevo, é o cuidado e a transparência em prestar contas do volume
de recursos arrecadados e gastos com cada edição. Por esses números, é possível
verificar que não há uma finalidade lucrativa no empreendimento, mas este já se
mostrou viável, pois existe há oito anos. As edições do Relevo podem ser
acessadas em (https://issuu.com/jornalrelevo/docs).
O
outro empreendimento cultural que conheci recentemente é o Teatro e Bar
Cemitério de Automóveis (https://www.facebook.com/cemiteriodeautomoveis1/).
Assisti a uma peça de Mário Bortolotto no teatro e junto com Edra Moraes passei
algum tempo no bar. Foi uma comédia deliciosamente escrachada, mas que, ao
mesmo tempo, nos convida à reflexão. Foi uma experiência de teatro muito
agradável.
Mário
nasceu em Londrina, onde criou o grupo de teatro Cemitério de Automóveis, que
foi transferido para São Paulo anos atrás. Além de ator, Mário é dramaturgo e,
em minha percepção, empreendedor. Empreendimentos culturais no campo do teatro
são muito comuns, mas o Cemitério de Automóveis me parece um pouco distinto da
maioria das casas de teatro. Além de combinar bar e teatro, o espaço do teatro
é muito pequeno com apenas 26 lugares, dedicando-se a um repertório menos
tradicional na dramaturgia brasileira. Se fosse usar um linguajar da
administração, é um empreendimento diferenciado que atende a um nicho mais
restrito de público. Ao contrário do Jornal Relevo, creio que o Cemitério de
Automóveis tenha finalidade lucrativa.
Os
dois empreendimentos são distintos, mas possuem atributos semelhantes. Em primeiro
lugar, são iniciativas de profissionais do campo da cultura que atendem a
nichos específicos de público. Dessa forma, pode ser que os seus criadores
tenham que constantemente equilibrar uma lógica criativa com uma lógica de
empreender com viabilidade. Em segundo lugar, dependem de uma capacidade de
articulação de recursos e pessoas que garantem sua existência ao longo do
tempo. O Relevo tem uma ampla rede de colaboradores que produzem conteúdo, ao mesmo
tempo em que consegue financiamento, de forma convencional, por meio de
anúncios e venda de assinaturas. O Cemitério de Automóveis, ao que me parece
tem uma equipe de colaboradores no bar, conta com o trabalho de atrizes, atores
e outros profissionais na montagem e exibição das peças. De forma mais
convencional, obtém sua renda por meio de venda de produtos e ingressos.
Tenho
muita curiosidade de conversar com empreendedoras(es) culturais. As poucas
informações que consegui sobre esses dois empreendimentos culturais me indicam
que este é um espaço que merece ser mais explorado nos estudos sobre
empreendedorismo no Brasil. Em especial, o que gostaria de explorar incialmente
é o que motiva estes empreendedores culturais, como lidam com diferentes
lógicas de pensar e agir,e como se deu o processo de empreender. É um campo. de
pesquisa fascinante!
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