quarta-feira, 31 de outubro de 2012

O encontro da coragem com a prudência: um texto multimídia sobre encontros, empreendedorismo e gestão

Encontros podem ser inspiradores. Nos últimos dias passei por alguns momentos da vida que podem ser reduzidos a encontros que fizeram a mente divagar. Assistindo ao delicioso e belísimo filme de Christophe Honore, As Bem Amadas, com Chiara Mastroianni e Catherine Deneuve (vejam trailer em http://www.youtube.com/watch?v=K_I8srnRHVM), uma cena de encontro entre pai e filha me despertou a imaginação. Catherine e Chiara interpretam mãe e filha (Madeleine e Véra) em um história que dura quase 50 anos. Milos Forman é o pai na fase adulta e Rasha Bukvic na infância e adolescêcia de Véra. Em uma conversa entre Milos Forman e Chiara, o pai diz algo assim para a filha (não me lembro da frase exata):

_ Você tem coragem e prudência. Duas virtudes centrais para o ser humano. A coragem é ser capaz de tentar fazer algo, mesmo sabendo que poderá não dar certo.

Empreender e gerenciar uma empresa ou organização são ações que precisam equilibrar as duas virtudes. Como está na wikipedia (me rendi a ela!), a prudência pode ser encarada como o exercício do julgamento sadio em questões práticas (http://pt.wikipedia.org/wiki/Prud%C3%AAncia). Sem usar essas palavras, já falei sobre a tensão entre a mudança e a permanência na gestão de pequenas empresas. A coragem de inovar (mudar) precisa ser balisada pela prudência, assim como é também a prudência que inspira a coragem da permanência do modo como se faz as coisas em qualquer organização.

Além de sair do cinema com uma sensação de bem-estar pela fruição de um sessão cinematográfica inspiradora sobre a vida em geral, fiquei com essa idéia na cabeça: será que já se abordou a questão da coragem no empreendedorismo? Chegando à minha sala, ao final da tarde, antes de ir para as aulas de Fundamentos da Gestão das Organizações, fiz uma rápida busca no google. Encontrei um post no Blog do Hashimoto, meu companheiro de ANEGEPE (www.anegepe.org). Texto muito bem escrito, inspirador mesmo, um encontro entre pai e filha que me fez lembrar quando ensinei Paloma e Fernanda a andarem de bicicleta nos tempos que moramos no campus da Universidade de Lancaster na Inglaterra. Um emocionante encontro com o passado inspirado pelo Marcos Hashimoto (http://www.marcoshashimoto.com/apps/blog/show/13774662-seguran-a-ou-risco).

Mas, tive outros encontros recentes nos últimos dias. Voltei a ser aluno após 35 anos vivendo o papel de professor. Decidi fazer um curso de especialização em cinema e tive meu primeiro reencontro com uma tarefa para casa. A professora Denize nos pediu que fizéssemos um breve comentário por escrito sobre um dos filmes que foram exibidos na edição curitibana do Kinoforum – Festival Internacional de Curtas-Metragens de São Paulo realizada esse ano. Entre os curtas que assisti durante os três dias que durou o festival, decidi escrever sobre o “Morning Stroll” (Caminhada Matinal), animação concebida e dirigida por Grant Orchard e produzida pelo Studio AKA em 2011 (http://br.bing.com/videos/search?q=you+tube+morning+stroll&view=detail&mid=02FC311965C05C008C2602FC311965C05C008C26&first=0&qpvt=you+tube+morning+stroll).

Com sete minutos de duração, o curta retrata 100 anos de permanência e mudança, por meio de três encontros entre um pedestre e uma galinha em Nova Iorque nos anos de 1959, 2009 e 2059. Com estilos de desenho distintos em cada momento, e com uma trilha sonora muito bem escolhida, o curta me fez pensar sobre essa tensão constante entre mudança e permanência. Embora, com um caráter de distopia, o curta permite que se reflita sobre as transformações que alteraram profundamente nossa sociedade ao longo dos últimos 50 anos, nem sempre para melhor, apontando para uma perspectiva sombria no futuro. Mas, toda essa reflexão é acompanhada de uma forma de humor leve que completa o trio de qualidades do curta: traços e desenhos muito bem feitos, excelente música e mensagem inspiradora.

O terceiro encontro está em um filme que ainda não vi. Paulo Camargo, na Gazeta do Povo de hoje, informa sobre o último filme de Abbas Kiarostami, homenageado na 36a. edição da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo (http://www.gazetadopovo.com.br/cadernog/conteudo.phtml?tl=1&id=1313493&tit=Kiarostami-conta-a-historia-de-um-amor-no-Japao). Já estou ansioso, aguardando a chegada desse filme na salas de cinema de Curitiba.

Segundo Camargo:

"A trama gira em torno de uma trombada amorosa inesperada: uma jovem prostituta (Rin Takanashi) conhece um tradutor idoso (Denden), que acabam enxergando, um no outro, um alento, a possibilidade de conseguirem aplacar a solidão na qual estão imersos... pessoas à deriva, se aproximam e encontram um no outro motivos para serem felizes. Ela quer estabilidade, um porto seguro, e ele, a negação da finitude."

A negação da finitude! Essa frase me marcou. Me parece que a gestão é uma tentativa constante de negação da finitude. A organização surge do esforço empreendedor, fertilizada pelo desejo da longevidade, mas muitas vezes assim como nós, a organização morre. O empreendedor/gestor constantemente tenta adiar esse encontro com a finitude que levará sua criação para o inevitável encontro com Hades, no subterrâneo empreendedor. Para tanto, nessa negação da finitude, se vale da coragem e de prudência, enfrentamento do inevitável e porto seguro, ousadia da mudança e crença na permanência.

Um encontro dessa mesma natureza, no mundo da vida real, presenciei anos atrás quando fazia minha caminhada diária pelo Passeio Público em Curitiba. Caminhadas vespertinas, ao som de ruídos diversos emitidos por carros, pessoas e pássaros. Certo dia, caminhando mais lentamento, próximo ao final da caminhada, ouço uma frase de uma prostitua para um senhor idoso, beirando os setenta anos:

_ Mas por dez reais, você quer mais o que?

Uma negociação se aproximava de seu final! Nesse encontro, talvez houvesse ainda a tentativa de negação da finitude por parte do idoso, mas a prostituta com certeza não estava em busca de um porto seguro. Para mim, ela estava, na verdade, tentando preservar um mínimo de dignidade (paradoxal, não?) ao valorizar seu serviço e indicando que, por dez reais, muito não seria feito!

Enfim, talvez o que sobre disso tudo, é persistir. A tensão entre mudança e permanência faz parte da vida humana e a nós cabe apenas lidar com ela. Se possível sendo capaz de, assim como Edith Piaf, não se arrepender de nada, como registrado inesquecivelmente por Cássia Eller?

http://letras.mus.br/cassia-eller/44923/

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