quarta-feira, 15 de novembro de 2023

O empreendedorismo não é um destino, mas sim um jeito de caminhar


Desde segunda-feira (13/11), a Superintendência de Parcerias e Inovações da Universidade Federal do Paraná (SPIN/UFPR) está realizando a 1a. Semana do Empreendedorismo Feminino UFPR. Não pude participar do primeiro dia da programação, porém, ontem deliberadamente me programei para participar do segundo dia, que teve a realização de seis painéis tratando de vários temas relacionados ao empreendedorismo feminino. Todos os painéis foram integrados por mulheres protagonistas do empreendedorismo feminino no Paraná. 

Um dos temas que fazem parte da minha carreira de pesquisador no campo do empreendedorismo, desde o início, é justamente o empreendedorismo feminino. Seja de forma isolada, ou em cooperação com pesquisadoras e pesquisadores, entender as motivações, dificuldades e realizações de mulheres empreendedoras é uma temática de estudo que sempre me atraiu. Entre as questões que me despertam a curiosidade de pesquisador está a busca do significado que o empreendedorismo tem para quem empreende, especialmente as mulheres. Aliás, neste blog já abordei alguns aspectos do empreendedorismo feminino (veja, por exemplo, estes quatro posts: Políticas públicas de empreendedorismo: jovens e mulheres (https://3es2ps.blogspot.com/2019/01/politicas-publicas-de-empreendedorismo.html); O significado de ser empresária (https://3es2ps.blogspot.com/2013/10/o-significado-de-ser-empresaria.html); Conversas com empresárias: lições de vida no mundo dos negócios (https://3es2ps.blogspot.com/2012/11/conversas-com-empresarias-licoes-de.html); e Trajetórias empresariais femininas: o encontro entre realidade e ficção (https://3es2ps.blogspot.com/2012/05/trajetorias-empresariais-femininas-o.html).

Assim, ao tomar conhecimento da programação do segundo dia da 1a. Semana do Empreendedorismo Feminino UFPR, dediquei meu tempo de trabalho na UFPR à participação nos seis painéis: Programas de Estímulo ao Empreendedorismo Feminino; Empreendedoras Protagonistas no Ecossistema Paranaense; Protagonismo Feminino em Spin-offs Acadêmicos; Gestoras de Ambientes de Inovação; Empreendedorismo Feminino Intergeracional; e Diversidade no Empreendedorismo Feminino. Como pode ser percebido, os painéis trataram de um conjunto de temas que me permitiram conhecer iniciativas de fomento e apoio ao empreendedorismo feminino que ocorrem no Paraná, bem como ouvir e me deliciar com as narrativas de várias mulheres sobre suas jornadas empreendedoras em vários setores de atividades. Foi um dia único de aprendizagem e reflexão para mim!

No segundo painel, que contou com a participação de três empreendedoras com certo destaque no ecossistema empreendedor curitibano, paranaense, e até mesmo nacional,  tive a oportunidade de lhes fazer uma pergunta: Em poucas palavras, qual o significado de ser empreendedora para você? As respostas foram carregadas de sentidos diversos e, ao mesmo tempo, complementares. Por si só já nos ajudam a ver como pode ser fascinante o mundo empreendedor, mesmo com todas as suas dificuldades e percalços. Para Mônica Berlitiz, "Empreender é respirar", Para Júlia Mendonça, "Empreender é liberdade". E, para Yara Lúcia Garcia, "Empreender é sonhar, planejar e realizar". Sínteses poderosas dessa ação humana complexa que é o empreender. E que, em meu entendimento, nos ajudam a compreender o que motiva o ser humano na ação empreendedora: viver, ser livre, sonhar, realizar...

No período da tarde, o aprendizado e a reflexão continuaram. Mais três painéis, e justamente no painel que trouxe três empreendedoras de gerações diferentes, ouvi uma frase que, parafraseei para dar título a esse post. Foi Dagmar Castro, a empreendedora mais experiente e longeva das mulheres que nos contaram suas trajetórias ontem, que começou indagando aos participantes por que os concursos eram tão atraentes como opção de carreira no passado? A partir de uma resposta de uma das jovens que estavam na plateia: segurança -, Dagmar Castro afirmou: "Segurança não é destino, é um jeito de caminhar". É a partir dessa fala, nos contou seus caminhos e seu jeitos de percorrê-los ao longo de décadas no empreendedorismo. Uma lição de vida inspiradora!

Por fim, chego ao último painel, em que a diversidade do empreendedorismo se revelou para nós, por meio de três histórias: uma indígena, uma negra e uma jovem com transtorno de espectro autista. Narrativas que me emocionaram, assim como me ensinaram. Nas falas dessas mulheres, ouvi ecos dos significados de ser empreendedora surgidos na manhã. Assim, como em outras falas da empreendedoras nos diversos painéis.

Foi este meu dia de trabalho ontem. Um dia em que, mais uma vez aprendi sobre empreendedorismo, com mulheres generosas que dedicaram um tempo de suas vidas, para nos contar sobre suas jornadas empreendedora. Um dia em que aprendi que o empreendedorismo não é um destino, mas sim um jeito de caminhar. Um jeito de caminhar que pode ser tão diverso quanto nós humanos e os caminhos que escolhemos. Um grande aprendizado para quem, neste momento da vida, quer ajudar os ecossistemas empreendedores a se tornarem efetivamente espaços inclusivos.

quinta-feira, 14 de setembro de 2023

Os acasos do empreender

Já comentei em outros textos, sobre a importância do pequeno varejo. Seja nos bairros de cidades de maior porte, ou nas pequenas cidades, é no pequeno varejo que as pessoas conseguem atender muitas necessidades de compras de mantimentos, medicamentos, frutas, legumes, entre outros produtos e serviços. Nem sempre, dá para esperar a próxima ida a uma filial dos grandes varejistas.
Porém, não é só a compra de conveniência que a gente encontra nos pequenos comércios. Junto com os secos e molhados do dia a dia, há sempre a possibilidade de uma conversa simpática. Ou informações sobre o que mais a gente pode comprar no bairro. Como aconteceu comigo tempos atrás. Enquanto, minhas compras na quitanda eram somadas pela proprietária, vi no canto um cartão de uma cuidadora de cães. Perguntei quem era. Na resposta veio o detalhe de ser a nora de outro comerciante do bairro e, principalmente, a recomendação:
_ Excelente pessoa. Muito carinhosa com os cãezinhos.
Depois de algumas semanas, surgiu a necessidade de deixar Kennedy por uns dias com alguém. Quem ficou com ele foi essa cuidadora carinhosa. Então, é no pequeno varejo do bairro que a gente compra o que precisa de última hora, fica sabendo de outros serviços na região, e de quebra, tem a oportunidade de conversar sobre a vida, o clima, os negócios, entre outros assuntos.
Eu, por exemplo, gosto de saber de como esses homens e mulheres seguiram por esse caminho na vida. As agruras e venturas do pequeno varejo.
Voltando da universidade para casa, após o término das aulas matutinas de hoje, escolhi um caminho mais longo. Retomei o hábito das caminhadas matinais. Mas, quando tenho aulas de manhã, não faço a caminhada diária de seis quilômetros. Apenas, caminho até o meu departamento que dista pouco mais de um quilômetro do prédio onde resido. Como disse, resolvi fazer um caminho mais longo, e fui na direção contrária a minha casa, contornando o Jardim Botânico e ladeando a rodovia. E, depois,  me embrenhando pelas ruas do bairro, em direção de casa. Cerca de 500 metros de onde moro, parei no Armazém Botânico para comprar frutas, mandioca, castanhas e goiabada. E, mais alguns produtos que me atraíram a atenção. Por exemplo, um pacote de doce de arroz em flocos. O preço estava mais barato do que no supermercado de maior porte localizado no bairro. Nem sempre o preço do pequeno varejo é mais caro!
O Armazém Botânico é de propriedade de um casal que o adquiriu há um ano e meio. Três meses antes de eu me mudar para o bairro. Em outra conversa, logo que me mudei para a vizinhança, eles já tinham me falado de quando compraram o antigo Armazém Botânico que só comercializava produtos naturais. Hoje, ao me lembrar disso, comentei com o casal:
_ Vocês devem estar por aqui há um ano e meio não?
Diante da confirmação, emendei:
_ E os negócios como andam?
A partir daí, fui indagando mais e mais, numa conversa que me fez refletir sobre os acasos, ou melhor, sobre o não planejado, ou o inesperado que, de vez em quando, dão um sabor especial à vida do comércio.
O casal me contou que, depois de seis anos morando na Bahia, decidiram voltar a Curitiba. Na época eles mantinham um comércio de acessórios para animais domésticos na Internet. Ficaram sabendo que um parente queria vender o açougue, também localizado no bairro. Negociaram um empréstimo bancário e, no dia que o dinheiro entrou na conta, o parente desistiu da venda. Não quis se desfazer do açougue. Continua até hoje no bairro. Diante da negativa, o casal se perguntou:
_ E agora? O que fazer com o dinheiro?
O acaso resolveu dar as caras! No dia seguinte, ficaram sabendo que, nas proximidades do açougue, o proprietário do Armazém Botânico queria vender o negócio. Entraram em contato e descobriram que outro casal já tinha apresentado uma proposta de compra. No meio da conversa, o casal comentou sobre a loja online de acessórios para animais domésticos e o carinho com todos os tipos de animais. Em frente ao Armazém Botânico há uma árvore frondosa que sempre atrai diferentes tipos de aves: pardais, sabiás, joões-de-barro e, nos meses mais quentes, as maritacas. Dois ou tres dias depois, o casal recebeu uma ligação do antigo dono. Tinha decidido vender para eles. O outro casal queria derrubar a árvore da frente da empresa. E, a partir desses acasos, a venda foi fechada.
Para alegria do casal, os negócios vão muito bem, obrigado! Continuam pagando as mensalidades do empréstimo em dia, já investiram em mais refrigeradores para diversos produtos que passaram a vender, além dos produtos naturais que o dono anterior já comercializava. Também criaram a seção de frutas, legumes e verduras. Bem como, outros produtos de secos e molhados. Tudo fruto de um trabalho árduo que começa às 4 horas da manhã, de segunda a sábado, e lhes dá também alguma renda para as despesas da vida. O casal sempre recebe os clientes com um sorriso amplo. E, nesse caminho, vão criando um verdadeiro armazém!

quinta-feira, 6 de abril de 2023

Configurações de ecossistemas empreendedores municipais no Brasil: uma análise inicial

O relatório Índice de cidades empreendedoras: Brasil 2023, realizado pela Escola Nacional de Administração Pública com apoio da Endeavor, foi publicado há alguns dias. Assim como na edição de 2022, no documento encontra-se o ranqueamento das 101 cidades mais populosas no Brasil pela pontuação no Índice de Cidades Empreendedoras (ICE), bem como o posicionamento de cada cidade nos sete determinantes que compõem o ICE: Ambiente Regulatório; Infraestrutura; Mercado; Acesso a Capital; Inovação; Capital Humano; e Cultura Empreendedora. Cada um desses determinantes, por sua vez, é o resultado da combinação de uma ou mais dimensões que agregam dados de diversas variáveis. No quadro 1, exibo o resumo da composição do ICE. Detalhes sobre coleta e tratamento dos dados estão disponíveis no próprio relatório.

Quadro 1 – Composição do Índice de Cidade Empreendedoras

 

Determinante

Dimensão

Variáveis

Índice de Cidades Empreendedoras (ICE)

Ambiente Regulatório

Tempo de Processos

Tempo de viabilidade de localização

Tempo de registro, cadastro e viabilidade de nome

Taxa de congestionamento em tribunais

Tributação

Alíquota interna do ICMS

Alíquota interna do IPTU

Alíquota interna do ISS

Qualidade de gestão fiscal

Complexidade Burocrática

Simplicidade tributária

Cnds municipais

Atualização de zoneamento

Infraestrutura

Transporte Interurbano

Conectividade via rodovias

Número de decolagens por ano

Distância ao porto mais próximo

Condições Urbanas

Acesso à internet rápida

Preço médio do m2

Custo da energia elétrica

Taxa de homicídios

Mercado

Desenvolvimento Econômico

Índice de Desenvolvimento Humano

Crescimento real médio do PIB

Número de empresas exportadoras com

sede na cidade

Clientes Potenciais

PIB per capita

Proporção entre grandes/médias e médias/pequenas empresas

Compras Públicas

Acesso a Capital

Capital Disponível

Operações de crédito por município

Proporção relativa de capital de risco

Capital poupado per capita

Inovação

Inputs

Proporção de mestres e doutores em C&T

Média de investimentos do BNDES e FINEP

Infraestrutura tecnológica

Proporção de funcionários em C&T

Contratos de concessão

Outputs

Patentes

Tamanho da indústria inovadora

Tamanho da economia criativa

Tamanho das Empresas TIC

Quadro 1 – Composição do Índice de Cidade Empreendedoras (continuação

Índice de Cidades Empreendedoras (ICE)

Capital Humano

Acesso e qualidade da mão de obra básica

Nota do Ideb

Taxa líquida de matrícula no ensino médio

Nota Média no ENEM

Proporção de adultos com pelo menos o ensino médio completo

Proporção de matriculados no ensino técnico e

profissionalizante

Acesso e qualidade da mão de obra qualificada

Proporção de adultos com pelo menos ensino superior completo

Custo médio de salários de dirigentes

Proporção de alunos concluintes em cursos de alta qualidade

Cultura Empreendedora*

Iniciativa

Pesquisas por Empreendedora

Pesquisas por Empreendedorismo

Pesquisas por MEI

Instituições

Pesquisas por Sebrae

Pesquisas por Franquia

Pesquisas por SIMPLES Nacional

Pesquisas por Senac

* Dados obtidos no Google Trends (2022)

Fonte: Adaptado de Índice de cidades empreendedoras: Brasil (2023)

A manutenção de uma estrutura de dados e variáveis, com poucas modificações, nos dois relatórios, bem como a elevada consistência dos determinantes escolhidos para a composição do ICE com a literatura recente sobre ecossistemas empreendedores (ISENBERG, 2010; STAM, 2015; STAM; VAN DE VEN, 2021; WURTH, STAM. SPIEGEL, 2022), me levaram a considerar a média dos resultados nos determinantes do ICE de cada cidade como uma boa aproximação do status das dimensões mais relevantes de cada ecossistema empreendedor local nos dois últimos anos. Ademais, como comentei em post anterior neste blog, penso que o entendimento da estrutura e dinâmica de ecossistemas empreendedores é melhor captada sob uma lente da abordagem das configurações (https://3es2ps.blogspot.com/2023/02/uma-analise-de-configuracoes-nos.html).

Assim, com os dados apresentados nos relatórios de 2022 e 2023, decidi fazer uma análise qualitativa buscando verificar como se configuram os melhores ecossistemas empreendedores municipais do Brasil. Para isto, selecionei as 33 cidades mais bem ranqueadas em cada um dos seguintes seis determinantes: Ambiente Regulatório; Infraestrutura; Mercado; Acesso a Capital; Capital Humano; e Cultura Empreendedora. O determinante Inovação, como exposto no quadro 1, é composto por Inputs e Outputs. Todavia, penso que esta forma de combinar variáveis de natureza distintas (entradas e saídas) em um determinante de ecossistema empreendedor não é muito adequada. Como se diz popularmente, é “misturar alhos com bugalhos”.

Minha opinião é que os inputs de inovação, conforme apresentados nos relatórios de 2022 e 2023, possuem a mesma natureza dos demais determinantes. Isto é, são indicadores que permitem avaliar a qualidade de um ecossistema empreendedor no que diz respeito ao estímulo para novas ações empreendedoras. Quanto mais entradas das diversas naturezas apresentadas no quadro 1, maior a probabilidade de surgimento do empreendedorismo inovador ou produtivo.

Por outro lado, a dimensão de outputs é muito mais um indicador de desempenho do ecossistema empreendedor do que de condições favoráveis ao empreendedorismo. Conforme exposto no quadro 2, as variáveis que intergam a dimensão outputs, quantificam resultados de ações empreendedoras em termos de número de patentes e número de empresas inovadoras, da economia criativa e de TIC.

Assim, utilizei, em minha análise, os dois indicadores (inputs e outputs) e não o indicador único de Inovação para cada cidade.  Isso foi possível, pois, felizmente, nos relatórios do ICE, estão presentes os valores para cada cidade de inputs, outputs e inovação. No total, foram tabulados os dados de 71 cidades, visto que houve uma grande variação entre os posicionamentos relativos dos 101 municípios em cada um dos seis determinantes e das duas dimensões de inovação.

A tabulação desses dados permitiu dois tipos de análise. Em primeiro lugar, ao utilizar os resultados de outputs como um indicador de desempenho foi possível classificar as 71 cidades em posições de desempenho maior ou menor.  Em segundo lugar, para cada uma das cidades, foram identificados os determinantes do ICE em que essas de destacaram, ou seja, determinantes em que se posicionaram entre as 33 cidades mais bem pontuadas. Este segundo procedimento permitiu identificar os municípios que se encontraram no terço de melhor desempenho em cada uma das dimensões e determinantes analisados. Mostro os resultados de ambas as análises apenas para as 15 cidades com maior pontuação em outputs, por economia de espaço, no quadro 2.

Quadro 2 – Desempenho das cidades em termos de outputs de inovação (média de 2022 e 2023) e determinantes de maior destaque

Posição

Cidade

Output

Configuração dos Determinantes de melhor desempenho (número)

01

São Paulo

8,72

Ambiente Regulatório, Infraestrutura, Mercado, Acesso a Capital e /Inputs (5)

02

Caxias do Sul

8,27

Mercado e Inputs (2)

03

Campina Grande

7,82

Inputs (1)

04

Curitiba

7,81

Infraestrutura, Mercado, Acesso a Capital, Capital Humano, Cultura Empreendedora e Inputs (6)

05

Florianópolis

7,79

Ambiente Regulatório, Infraestrutura, Mercado, Acesso a Capital, Capital Humano, Cultura Empreendedora e Inputs (7)

06

Campinas

7,79

Infraestrutura, Acesso a Capital, Capital Humano e Inputs (4)

07

Limeira

7,66

Infraestrutura, Mercado e Capital Humano (3)

08

Porto Alegre

7,56

Infraestrutura, Mercado, Acesso a Capital, Capital Humano e Inputs (5)

09

Blumenau

7,55

Ambiente Regulatório, Mercado e Acesso a Capital (3)

10

Joinville

7,52

Ambiente Regulatório, Mercado, Capital Humano e Inputs (4)

11

São José dos Campos

7,52

Infraestrutura, Mercado, Capital Humano e Inputs (4)

12

Rio de Janeiro

7,36

Ambiente Regulatório, Mercado, Acesso a Capital e Inputs (4)

13

São Bernardo do Campo

7,36

Infraestrutura, Mercado, Acesso a Capital, e Capital Humano (4)

14

Diadema

7,31

Mercado e Inputs (2)

15

Santo André

7,14

Infraestrutura, Mercado e Capital humano (3)

Elaborado pelo autor

Utilizo o quadro 2 apenas para exemplificar como a abordagem das configurações pode ajudar a entender um pouco mais como diferentes ecossistemas empreendedores, com presença mais acentuada de um ou mais determinantes podem atingir desempenhos superiores. Ou seja, consistente com a abordagem das configurações não existe apenas um único caminho para obter bons resultados de ecossistemas empreendedores.

Por exemplo, ao se comparar São Paulo e Caxias do Sul, as duas cidades de melhor desempenho, se percebe que o conjunto das forças dos dois ecossistemas empreendedores são bem distintos. São Paulo se mostrou bem-posicionada em cinco determinantes (Ambiente Regulatório, Infraestrutura, Mercado, Acesso a Capital e Inputs), ao passo que Caxias do Sul em apenas dois (Mercado e Inputs). Apesar dessa diferença, o resultado de Caxias do Sul em Output foi apenas 0,5 ponto abaixo do de São Paulo.

Campina Grande, por outro lado, teve o terceiro melhor desempenho e teve como destaque apenas a dimensão Inputs. As três cidades têm em comum o bom posicionamento em Inputs, o que pode sugerir que esta dimensão seja muito relevante para ecossistemas empreendedores. De fato, esta dimensão esteve presente como destaque também em mais oito cidades do quadro 2.

O caso de Campina Grande pode ser comparado, também, a Curitiba e Florianópolis. Estas duas capitais apresentaram o maior número de determinantes com destaque em seus resultados, 6 e 7, respectivamente. E, curiosamente, tiveram um desempenho muito semelhante ao de Campina Grande no que diz respeito à dimensão de Outputs.

Uma última comparação demonstra, mais uma vez, que configurações semelhantes podem levar a desempenhos próximos. Limeira e Santo André, cujos resultados em output foram, respectivamente, 7,66 e 7,14, tiveram suas maiores forças relacionadas a Infraestrutura, Mercado e Capital Humano.

É claro que a análise que aqui apresento é muito limitada por se concentrar em um conjunto reduzido de 15 cidades, bem como considerando apenas os determinantes e dimensões em que estiveram no terço superior da amostra. Uma análise dos 101 municípios, com base, por exemplo em análise de clusters e análise multivariada das variáveis de posicionamento e desempenho, pode produzir um resultado que consiga identificar diferentes configurações de ecossistemas empreendedores locais no Brasil, com base em determinantes e dimensões com variados níveis de intensidade. Este é o tipo de análise que tenho realizado com um grupo de pesquisadores/amigos (Rafael Stefenon, Edmundo Inácio Júnior e Eduardo Avancci Dionísio). Outra possibilidade é utilizar as ferramentas de análise qualitativa comparativa (QCA ou fsQCA) que já foi testada em investigações de outros pesquisadores. E que planejamos experimentar nos estudos que estamos conduzindo.

Nesse momento, talvez, surja uma pergunta: esse esforço de análise vale a pena? Minha opinião é que os resultados de análises de configurações em ecossistemas empreendedores têm grande valia para formuladores de políticas públicas em empreendedorismo. Recentemente, Rafael Stefenon e eu publicamos um ensaio onde tentamos evidenciar os possíveis ganhos dessa abordagem (STEFENON; GIMENEZ, 2023).

Ainda nesse sentido de apoio à decisão de políticas de empreendedorismo, pode ser apontado um aspecto interessante. Para as 15 cidades apresentadas no quadro 2, é possível perceber que há alguns determinantes/dimensões mais frequentes. Mercado foi relevante para 13 cidades, Inputs esteve presente em 11, e Infraestrutura e Capital Humano em 9 cidades. Esta é a combinação de forças que posicionaram São José dos Campos em 11º. lugar nesta análise. Como usar esta informação do ponto de vista de política pública? Talvez, uma resposta possível seja na direção de que, em condições de escassez de recursos, dirigentes municipais podem enfatizar investimentos e apoio na consolidação de mercados, na diversidade de inputs de inovação, na melhoria de infraestrutura e no desenvolvimento de capital humano. Não é simples, nem exato, mas é uma direção a ser tentada.

 Referências

Índice de cidades empreendedoras: Brasil 2023 / Escola Nacional de Administração Pública; apoio de Endeavor. -- Brasília: Enap, 2023. 152 p.

Isenberg, D. J. How to start an entrepreneurial Revolution. Harvard Business Review, 88, p. 41-49, 2010.

Stam, E. Entrepreneurial ecosystems and regional policy: a sympathetic critique. European Planning Studies, v. 23, n. 9, p. 1759-1769, 2015.

Stam, E.; Van de Ven, A. Entrepreneurial ecosystem elements. Small Business Economics, v. 56, n. 2, p. 809-832, 2021.

Stefenon, R.; Gimenez, F. A. P. Entrepreneurial ecosystems: a configurational research approach. Revista Gestão em Análise, v. 12, n. 1, p. 7-22, 2023.

Wurth, B.; Stam, E.; Spigel, B.  Toward an Entrepreneurial Ecosystem Research Program. Entrepreneurship Theory and Practice, v. 46, n. 3, 729-778, 2022.