domingo, 25 de novembro de 2018

TÚNEL DO TEMPO 3 - Financiando a pequena empresa

Mais um texto publicado na Folha de Londrina no começo dos anos 90. Dando continuidade à série Túnel do Tempo. Dessa vez com um texto sobre financiamento da micro e pequena empresa. Naquela época ainda não se falava muito de capital de risco e financiamento-anjo. De qualquer forma, há algumas coisas no texto que se mantém relevantes. A ousadia de um jovem pesquisador se manifestava! Ainda tenho um pouco dela!

FINANCIANDO A PEQUENA EMPRESA
Um dos problemas mais aflitivos vivenciados por dirigentes de micro e pequenas empresas refere-se à obtenção de empréstimos junto ao sistema financeiro com o objetivo de atender suas necessidades de capital de giro ou de investimento. Este problema se manifesta, principalmente, através de dois aspectos: o custo do dinheito e a dificuldade de acesso ao mesmo.
Uma das características marcantes da economia brasileira nos últimos anos é a prática de elevadas taxas de juros. Esta realidade deverá continuar ainda por um bom tempo. Altas taxas de juros são inevitáveis quando se adotam políticas severas de controle da expansão monetária, como mecanismo de controle da inflação. ao que tudo indica, por exemplo, a curto prazo, o Banco Central deverá cumprir a meta de limitar a expansão monetária a 9%. Isto, evidentemente, contribuirá em muito para a manutenção de taxas de juros elevadas.
Esta situação, que afeta indistintamente as empresas, independente de seu porte, repercurte mais intensamente sobre as micro e pequenas empresas, que geralmente são forçadas a fazer face a custos mais elevados quando conseguem algum empréstimo.
O aspecto mais crucial na relação das empresas de pequeno porte com o sistema financeiro, no entanto, não reside na taxa de juros, mas na inexistência de linhas de financiamento específicas para o setor. A disputa de recursos no mercado com as grandes empresas acaba sendo prejudicada pela impossibilidade de apresentar as garantias exigidas pelos agentes financeiros na concessão de empréstimos. Em muitos casos, as pequenas empresas são obrigadas a recorrer ao mercado informal de recursos financeiros, tendo em vista as dificuldades surgidas no relacionamento com o mercado financeiro. Esta saída, obviamente, implica em um acréscimo ainda maior nos seus custos.
Em outros tempos, as micro e pequenas empresas contaram com mecanismos específicos para enfrentar suas necessidades de capital. Atualmente, apesasr de a Constituição Federal garantir-lhes um tratamento diferenciado nos aspectos administrativos, tributários e financeiros em relação às grandes empresas, não existem linhas especiais de crédito às empresas de pequeno porte.
Uma solução duradoura para este problema pode ser encontrado na adaptação de um instrumento já existente no mercado financeiro: a caderneta de poupança.
Como se sabe, a caderneta de poupança é o meio mais adequado para o pequeno poupador acumular recursos durante determinado período de tempo. Em situações econômicas relativamente estáveis, esta peculiaridade faz com que os recursos aplicados neste tipo de investimento não sofram grandes oscilações em termos de volume. Isto facilita a administração dos empréstimos sob esta cobertura. Atualmente, a caderneta vem sendo utilizada como instrumento de financiamento da construção civil e agricultura.
A criação de uma caderneta de poupança como meio de captação de recursos para apoiar o desenvolvimento de micro e pequenas empresas pode ajudar na redução das dificuldades que este tipo de empresa enfrenta para suprir suas necessidades de capital.
Por um lado, a implementação da caderneta de poupança da pequena empresa faria com que os custos financeiros na obtenção de empréstimos pelo proprietário de um pequeno negócio sejam bem menores, em função dos atuais níveis de remuneração dos investidorees em caderneta de poupança. Por outro, o acesso das pequenas empresas a recursos financeiros seria facilitado visto que existiria um volume determinado de capital a ser destinado pelo sistema financeiro às empresas do setor.
A questão das garantias ao empréstimo, enfim, seria o único aspecto a não ser coberto pelo mecanismo proposto. No entanto, pode-se criar um seguro para garantir, no todo ou em parte, os empréstimos dos recursos obtidos com a caderneta da pequena empresa.
Esta ideia pode ser estudada com mais detalhes pelos agentes econômicos do sistema financeiro nacional em conjunto com as inúmeras associações de classe que aglutinam micro e pequenas empresas. A contribuição das empresas de pequeno porte para a economia brasileira é muito significativa. A criação de mecanismos que sustentem sua sobrevivência e desenvolvimento é fundamental para que o setor cotinue desempenhando seu papel econômico.

domingo, 23 de setembro de 2018

TÚNEL DO TEMPO 2 - Pequenas empresas e o desenvolvimento


Neste post reproduzo artigo que publiquei na Folha de Londrina em 26/04/1990. Como comentei no post que deu origem a esta série, foi devido ao esforço de preservação da história familiar que minha mãe, Kilda Gomes do Prado Gimenez, empreendeu ao longo de sua vida, que estou tendo esta possibilidade de resgatar textos do início de minha carreira nos estudos da Administração. Os textos foram preservados em meu álbum de Vida. Vejo esta série como um retorno a ideias e pensamentos que povoaram minhas reflexões iniciais neste campo de estudos. De certa forma, os textos foram o embrião de temas e preocupações acadêmicas que ainda estão comigo e serão aprofundadas em minha participação no Programa de Pós-Graduação em Pol´ticas Públicas da UFPR. Vem comigo!

Pequenas empresas e o desenvolvimento
Um conjunto de lideranças empresariais, políticas e acadêmicas da região vêm discutindo, há algum tempo, a necessidade de se envidarem esforços para a retomada do desenvolvimento econômico do Norte do Paraná.
Qualquer debate desta natureza não pode deixar de considerar o papel que as micro e pequenas empresas desempenham e a contribuição que estas trazem na consecução de um desenvolvimento econômico-social mais equilibrado. As pequenas empresas são um eficiente instrumento de melhor distribuição de renda e desconcentração das atividades econômicas, visto que complementam as atividades das grandes organizações, ocupam mercados não atendidos suprindo as necessidades de consumo de grande parte da população, absorvem mão-de-obra pouco ou não qualificada e são uma importante fonte de inovações tecnológicas.
Além disso, as micro e pequenas empresas são a maneira mais rápida e barata  de geração de empregos. Pesquisas do Banco Mundial indicaram que a geração de uma unidade de emprego em pequenas unidades produtivas consumiu apenas um terço dos recursos aplicados por grandes empresas ao proporcionarem o mesmo posto de trabalho. Só este fato já justifica uma atenção especial às micro e pequenas empresas quando da discussão e formulação de políticas de desenvolvimento mais abrangentes.
Apesar desta importância, a sobrevivência das pequenas empresas é dificultada por inúmeras barreiras. Em recente pesquisa, verificou-se que os problemas mais frequentes enfrentados pelos dirigentes de pequenos negócios estão intimamente relacionados à falta de habilidades administrativas.
Uma política de desenvolvimento empresarial deve, portanto, incluir a facilitação do acesso pelos pequenos empresários às fontes de conhecimento administrativo, bem como a criação de um ambiente propício ao surgimento de novos pequenos negócios visando a geração de empregos.
Este pode ser conseguido através dos investimentos tradicionais em infra-estrutura urbana da região, mas pode ser mais facilmente obtido se esforços forem direcionados para a criação de centros de treinamento para a mão-de-obra não qualificada disponível no mercado, contribuindo para a solução de um dos problemas que mais afligem as pequenas empresas. Estes centros de treinamento poderiam ser criados e administrados de forma cooperativa com o envolvimento dos governos municipais, associações empresariais e instituições de ensino superior.
Por outro lado, o acesso dos pequenos empresários às modernas técnicas de administração não pode deixar de envolver o potencial existente nos cursos de Administração da região. Mais uma vez, a ação conjunta dos empresários, governos locais e instituições de ensino pode viabilizar recursos que permitam a estas direcionar parte de seu corpo docente para o desenvolvimento de atividades de extensão, tais como cursos, palestras e trabalhos de consultoria, com o imprescindível envolvimento dos alunos.
O desenvolvimento econômico-social só pode acontecer quando empregados e empregadores têm chances de se desenvolver profissionalmente, e este só é alcançado quando o esforço cooperativo democratiza o acesso ás fontes de conhecimento e gerenciamento mais eficaz.

Pois é, já naquela época algumas questões que julgo ainda relevantes estavam em meu discurso: democratização do conhecimento, parcerias intrasetoriais, cooperação entre  universidades e empresas e a importância das pequenas empresas para um desenvolvimento mais equilibrado e sustentável.

terça-feira, 18 de setembro de 2018

TÚNEL DO TEMPO 1 - Pequenas empresas nos anos 90


Graças ao esforço de preservação da história familiar que minha mãe, Kilda Gomes do Prado Gimenez, empreendeu ao longo de sua vida, tenho em minhas mãos um álbum da vida com fotografias, documentos, informações, reportagens impressas e cópias de textos que escrevi ao longo de boa parte de minha vida. A fotografia que ilustra este post é a reprodução da contracapa e página inicial de meu álbum de vida. Esse garoto sorridente sou eu antes do primeiro aniversário.

Em três semanas começarei minha atuação como professor do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas com uma disciplina sobre Políticas Públicas de Fomento ao Empreendedorismo. Hoje, folheando meu álbum de vida, encontrei algum textos que escrevi e foram publicados na Folha de Londrina, jornal diário da cidade que existe há muitas décadas em Londrina. São textos do começo dos anos 90 em que comentei sobre questões associadas ao estímulo às pequenas empresas e sobre seu desenvolvimento
Minha presença neste blog tem sido muito esporádica nos últimos meses. Venho pensando alguns textos para ele, mas as atividades acadêmicas e administrativas na UFPR acabam empurrando a escrita para outros momentos. Ao encontrar meus textos de 28 anos atrás, decidi retomar os posts do blog. Começarei com a reprodução daqueles textos publicados na Folha de Londrina. Um resgate das ideias que estavam em minha mente à época e, provavelmente, ainda devem fazer sentido. Começo com o texto Pequenas empresas nos anos 90 de 26 de janeiro de 1990. Nele abordo temas que se consolidariam em meus estudos sobre estratégia de pequenas empresas que são parte relevante de minha produção acadêmica desde então. Vem comigo!

Pequenas empresas no anos 90
O professor Rattner, em recente artigo na Folha de São Paulo, afirmou que a evolução da informática aplicada às empresas está delineando um novo paradigma tecnológico, que demandará das pequenas e médias empresas (PMEs) ações que levem à sua modernização administrativa, para que possam usufruir plenamente dos benefícios deste paradigma.
A par das exigências postas pelo novo paradigma tecnológico, a crescente internacionalização da economia colocará novos desafios às PMEs, através de uma concorrência mais acentuada. A formação dos grandes blocos econômicos (Europa 92, EUA e Canadá, países asiáticos) será um fator adicional no acirramento da competição empresarial a nível internacional. Por outro lado, as transformações econômicas e sociais pelas quais vêm passando os países socialistas podem significar oportunidades comerciais a serem exploradas também pelas PMEs.
O comportamento do consumidor, por sua vez, está sofrendo uma transformação no sentido de fugir à padronização que tem caracterizado a sociedade industrial. A diferenciação nos hábitos de consumo, a procura por produtos e serviços especializados, fazem com que as vantagens da economia de escala deixem de ser tão importantes. Esta tendência, aliada às facilidades que a informática e a automação industrial estão apresentando, levam a crer que os espaços a serem ocupados pelas PMEs poderão ser muito ampliados.
Para que as PMEs possam fazer face às ameaças e oportunidades que se delineiam para os anos 90 é necessário que seus dirigentes passem a adotar, com grande ênfase, duas práticas administrativas essenciais: o comportamento estratégico e estratégias de cooperação.
O pequeno empresário, em geral, adota um estilo de administração introvertido, ou seja, é tão absorvido por atividades rotineiras de sua empresa que acaba prestando pouca atenção à evolução do mercado em que atua. A ação do pequeno empresário de sucesso deve estar muito mais voltada para o relacionamento de seu negócio com o ambiente empresarial. O sucesso da empresa está, em maior grau, relacionado à eficácia com que a empresa se adapta às transformações que ocorrem à sua volta e, em menor grau, relacionada à eficiência com que as operações internas são realizadas visando conseguir aquela adaptação. Em suma, é preciso que o dirigente de uma pequena empresa passe a adotar o planejamento estratégico como uma das ferramentas na administração de seu negócio.
Por outro lado, os anos 90 exigirão das PMEs novas posturas nas suas relações com fornecedores, consumidores, reguladores, financiadores e trabalhadores. Estas se caracterizarão basicamente pela adoção de uma estratégia de cooperação intrasetorial.
Em relação aos reguladores, as associações de pequenas empresas atualmente vêm desempenhando uma ação coletiva muito eficaz, através dos grupos de pressão. Este tipo de atividade, além de divulgar os aspectos positivos do segmento, seus problemas e necessidades, é eficaz também na obtenção de apoio legislativo, através da pressão junto aos legisladores, como bem exemplifica a história recente de nossa última constituição federal.
Da mesma forma, a nível de ramo de negócio, cooperativas ou associações poderiam ser formadas visando desenvolver atividades direcionadas para cada um dos públicos externos. Por exemplo, em relação aos fornecedores, a instalação de centrais de compra permitiria a obtenção de benefícios em relação a preços, condições de pagamento e qualidade dos insumos. No que diz respeito aos consumidores, esforços coletivos poderiam ser desenvolvidos no campo da publicidade institucional e da pesquisa sobre o consumidor. Estas ações redundariam em ampliação do mercado total, por um lado, e melhor conhecimento do consumidor por outro. Grupos de negociação coletiva e centros de treinamento são atividades que podem ser desenvolvidas no que diz respeito à mão-de-obra.
Se o associativismo, de uma maneira geral, apresenta excelentes resultados, independentemente do porte das empresas envolvidas, no caso das PMEs esta prática deve ser incentivada com a maior ênfase possível, tendo em vista seu enorme potencial de contribuição na superação das dificuldades que as pequenas empresas enfrentam em sua ibserção no mercado.

Quem diria? Eu já fui um apóstolo do planejamento estratégico! Era impossível escapar dessa influência nos anos 80, meus anos de formação na graduação e mestrado em administração. Mas, além disso, já havia algum embrião da preocupação com os stakeholders e com as estratégias que seriam mais tarde chamadas de coopetição. Por fim, era difícil fugir do caráter normativo do texto, cheio de o que tinha ou deveria ser feito!

O texto me identificava como administrador e professor-assistente do Departamento de Administração da Universidade Estadual de Londrina. Ainda não tinha começado meu doutoramento, que só ocorreria a partir de 1991.

quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Economia criativa e empreendedorismo cultural

Em uma conversa com os integrantes do Fórum Desenvolve Londrina (http://www.forumdesenvolvelondrina.org/) apresentei minha visão da economia Criativa sob uma perspectiva empreendedora e cultural. Como apresentado no site do Fórum, este é "um movimento criado por força de decreto-lei, composto por entidades e pessoas de diversos segmentos, e que tem por objetivo aglutinar a sociedade organizada e mobilizar a comunidade para o desenvolvimento sustentável de Londrina e região, por meio de atividade permanente de prospecção de futuro e planejamento estratégico, independente de política partidária".
Fiz uma fala inicial de pouco mais de 45 minutos e depois tive o privlégio de responder perguntas e trocar ideias com as pessoas presentes. 
A minha palestra foi transmitida ao vio e gravada e pode ser acessada neste link: https://www.facebook.com/ForumDesenvolveLondrina/videos/287860385139590/?hc_ref=ARTWm2qtHJON5skFfFRoDrf5GFrqwA3NFYb9JGBqzNEc9wWV07vTL3mNmSG3sNji_m8&__xts__[0]=68.ARCdhQJMfBiVsxX-B3WjbBz5OGXVCHGoCdKVDpf_wf3lsjAjicZQuPMy5juac7FMCKaMz4swgl4or_8lOreeVQXDYxviCZ3LTVlNe_74ZJBp6V2iBujOoX7AydFWuTrBq7E2t1o&__tn__=kCH-R
Em resumo, após uma breve exposição histórica e conceitual sobre a economia criativa e economia da cultura, procurei explorar as possibilidades de apoio àqueles que desejam empreender no campo da economia da cultura. Parti de uma questão inicial: Como os que empreendem nesse campo lidam com interesses e objetivos que podem ser, às vezes, conflitantes?
O argumento seguiu essa linha:
1. Há uma tensão central no campo do empreendedorismo cultural: conciliar demandas de sustentabilidade econômico-financeira do modo capitalista dominante em nossa sociedade com aspirações e desejos expressivos de natureza predominantemente subjetivas manifestados no ato criativo do empreendedor cultural.
2. Assim como no empreendedorismo sustentável, no empreendedorismo cultural o econômico-financeiro pode ser visto como meio e não finalidade principal do processo empreendedor.
3. Há uma dualidade na identidade do empreendedor cultural: ora é visto como agente criativo no campo da cultura propiciando valores simbólicos para a sociedade, ora é visto como agente econômico gerador de valores financeiros para um mercado.
4. Esta dualidade pode apresentar implicações no campo do fomento ao empreendedorismo cultural, ao exigir dos agentes públicos uma sensibilidade tanto para a ação simbólica do empreendedor cultural quanto para sua ação econômico-financeira.
5. Na economia da cultura há uma forte relação entre a produção cultural e o apoio direto e indireto (via renúncia fiscal) do governo.
6. Isso implica na necessidade de desenvolvimento de competências em três áreas: criação artística; atuação empresarial; e legitimação artística e empresarial face aos fomentadores públicos e privados da atividade.
7. Portanto, as política públicas de fomento ao empreendedorismo cultural devem enfatizar a articulação dos atores da economia da cultura com outras pessoas e organizações que lhes permitam desenvolver suas habilidades criativas, competências de negócios e capacidades de sensibilização de agentes apoiadores e financiadores.
8. Por outro lado, há possibilidade de ampliação dos esforços de educação para o empreendedorismo de jovens para atuação no campo da economia criativa e da cultura, tanto em instituições formais quanto por meio de outras formas de educação não formal.
9. Mais especificamente, dvee haver esforços em direção à educação para o desenvolvimento de uma atitude empreendedora e de competências empreendedoras no campo da formação em artes e humanidades em geral, bem como em algumas profissões liberais com interface na economia da cultura. Por exemplo, Comunicação, Direito, Design, Turismo, entre outras.
10. Por fim, deve ser ressaltado e enfatizado o papel de programas municipais de incentivo à cultura e os impactos da proliferação de festivais culturais sobre a economia da cultura e economia geral de uma localidade. Por exemplo, o Programa Municipal de Incentivo à Cultura – PROMIC  de Londrina criado pela Lei Municipal n º 8.984, de 06 de dezembro de 2002, que criou também o Fundo Especial de Incentivo à Cultura - FEPROC. 
11. Nessa linha, pode ser salutar para o desenvolvimento da economia da cultura e para o surgimento de novos empreendimentos neste campo, a nserção de atividades de negócios nos festivais, como ocorre em muitos festivais de cinema


quarta-feira, 11 de julho de 2018

EMPREENDEDORISMO CULTURAL: DUAS BREVES HISTÓRIAS


O tema do empreendedorismo cultural tem me atraído nos últimos anos. Minha primeira aproximação se deu quando, ao preparar um trabalho de conclusão de curso de especialização em Cinema, relatei minha experiência com a criação da Revista Livre de Cinema. Este texto, com algumas modificações, foi publicado em formato de artigo na Revista de Empreendedorismo e Inovação Sustentáveis (http://revista.isaebrasil.com.br/index.php?journal=revise&page=article&op=view&path%5B%5D=7&path%5B%5D=GIMENEZ-v1n12016).
Antes desse artigo, embora eu não tenha usado o termo empreendedorismo cultural, esta noção surgiu de forma embrionária em meu modelo mental sobre o empreendedorismo quando comentei a palestra dada por Lucia Murat em Curitiba no post A pequena empresa como espaço expressivo do empreendedor (http://3es2ps.blogspot.com/2013/05/a-pequena-empresa-como-espaco.html). Nesse momento, enxerguei a cineasta como uma empreendedora, ao mesmo tempo em que avançava a ideia de que empreender pode ser visto como um ato de expressão para o mundo, ou seja, um momento de criatividade. Ora, os empreendedores culturais são o tipo de empreendedor onde essa vontade de se expressar para o mundo se manifesta cotidianamente em suas manifestações culturais.
Desde então, tenho refletido sobre o tema e, vez ou outra, escrevo algo. Uma das questões que tenho intenção de explorar de forma mais aprofundada se relaciona com a identidade empreendedora dos que empreendem no campo da cultura. Por ser um campo de atuação que envolve a constante aplicação de processos criativos, ao mesmo tempo em que, demanda o domínio de uma lógica de articulação de recursos de forma sustentável, independente da natureza lucrativa ou não das ações empreendedoras nesse campo, penso que o empreendedorismo cultural pode gerar um conflito existencial naqueles que empreendem no campo.
Assim, pode ser que os atores desse campo não se sintam muito confortáveis quando são identificados como empreendedores. Por exemplo, em janeiro deste ano, publiquei outro post em que falo de Nitis Jacon como uma empreendedora cultural (http://3es2ps.blogspot.com/2018/01/nitis-jacon-uma-empreendedora-cultural.html). Não sei se Nitis concordaria com esta qualificação, mas tenho certeza que sua trajetória profissional, especialmente à frente do Festival Internacional de Londrina, é um ótimo exemplo de empreendedorismo cultural.
No ano passado, publiquei um livro com os resultados de levantamento que fiz sobre a produção brasileira no campo do empreendedorismo disseminada na forma de artigos. Criei também uma tipologia de temas de pesquisa no campo do empreendedorismo brasileiro. O empreendedorismo cultural é um campo que surgiu recentemente e ainda não tem uma produção numerosa. O livro pode ser acessado em (https://www.dropbox.com/s/8bayerejmtevqpv/Empreendedorismo%20-%20uma%20bibliografia%20de%20artigos%20publicados%20em%20peri%C3%B3dicos%20brasileiros.pdf?dl=0).
Neste momento, desejo comentar sobre dois empreendimentos culturais que conheço. Um deles de Curitiba, que conheçi há alguns anos. O outro é de São Paulo, que pude visitar dias atrás. São empreendimentos em campos distintos, literatura e teatro, mas demonstram, em minha percepção alguns aspectos dessa dualidade que é empreender no campo da cultura.
Há alguns anos, conheci o Jornal Relevo que encontrei em uma biblioteca. Distribuído gratuitamente, ele existe desde setembro de 2010. Conforme descrito em sua página no Facebook (https://www.facebook.com/pg/jornal.relevo/about/?ref=page_internal), é um impresso mensal de cultura, sobretudo de literatura, editado pelo jornalista Daniel Zanella. Uma das coisas que me chamou a atenção, além do conteúdo do Relevo, é o cuidado e a transparência em prestar contas do volume de recursos arrecadados e gastos com cada edição. Por esses números, é possível verificar que não há uma finalidade lucrativa no empreendimento, mas este já se mostrou viável, pois existe há oito anos. As edições do Relevo podem ser acessadas em (https://issuu.com/jornalrelevo/docs).
O outro empreendimento cultural que conheci recentemente é o Teatro e Bar Cemitério de Automóveis (https://www.facebook.com/cemiteriodeautomoveis1/). Assisti a uma peça de Mário Bortolotto no teatro e junto com Edra Moraes passei algum tempo no bar. Foi uma comédia deliciosamente escrachada, mas que, ao mesmo tempo, nos convida à reflexão. Foi uma experiência de teatro muito agradável.
Mário nasceu em Londrina, onde criou o grupo de teatro Cemitério de Automóveis, que foi transferido para São Paulo anos atrás. Além de ator, Mário é dramaturgo e, em minha percepção, empreendedor. Empreendimentos culturais no campo do teatro são muito comuns, mas o Cemitério de Automóveis me parece um pouco distinto da maioria das casas de teatro. Além de combinar bar e teatro, o espaço do teatro é muito pequeno com apenas 26 lugares, dedicando-se a um repertório menos tradicional na dramaturgia brasileira. Se fosse usar um linguajar da administração, é um empreendimento diferenciado que atende a um nicho mais restrito de público. Ao contrário do Jornal Relevo, creio que o Cemitério de Automóveis tenha finalidade lucrativa.
Os dois empreendimentos são distintos, mas possuem atributos semelhantes. Em primeiro lugar, são iniciativas de profissionais do campo da cultura que atendem a nichos específicos de público. Dessa forma, pode ser que os seus criadores tenham que constantemente equilibrar uma lógica criativa com uma lógica de empreender com viabilidade. Em segundo lugar, dependem de uma capacidade de articulação de recursos e pessoas que garantem sua existência ao longo do tempo. O Relevo tem uma ampla rede de colaboradores que produzem conteúdo, ao mesmo tempo em que consegue financiamento, de forma convencional, por meio de anúncios e venda de assinaturas. O Cemitério de Automóveis, ao que me parece tem uma equipe de colaboradores no bar, conta com o trabalho de atrizes, atores e outros profissionais na montagem e exibição das peças. De forma mais convencional, obtém sua renda por meio de venda de produtos e ingressos.
Tenho muita curiosidade de conversar com empreendedoras(es) culturais. As poucas informações que consegui sobre esses dois empreendimentos culturais me indicam que este é um espaço que merece ser mais explorado nos estudos sobre empreendedorismo no Brasil. Em especial, o que gostaria de explorar incialmente é o que motiva estes empreendedores culturais, como lidam com diferentes lógicas de pensar e agir,e como se deu o processo de empreender. É um campo. de pesquisa fascinante!


quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Nitis Jacon, uma empreendedora cultural

Passando férias em São Francisco do Sul, na casa de minha irmã Kilda. Dias atrás, encontrei um livro escrito por Nitis - Memória e Recordação Festival Internacional de Londrina - 40 anos. Nele, uma dedicatória de Nitis para Kilda. Sem data. Me apaixono pelo relato de Nitis e decido, após sua leitura, escrever esse post. Foram mais de 40 dias sem visitar meu blog. No segundo semestre do ano passado, alías, andei afastado de meus blogs. Escrevi muito. Mas, foram escritos mais técnicos, guiados por um estilo mais formal. Em férias, deixo a imaginação e emoção me guiarem. Inspirado pelo relato de Nitis, quero registrar a minha percepção dela enquanto empreendedora cultural à frente do Festival Internacional de Londrina (FILO)
Me vem â mente, meu primeiro escrito sobre o tema. Foi, também, inspirado por uma mulher. Uma cineasta. Registrei minha reação às palavras de Lucia Murat quando, alguns anos atrás, em maio de 2013, ao assistir a sua palestra em Curitiba, antes da exibição do making of do filme A memória que me contam, inspirei-me na possibilidade dela ser vista como empreendedora cultural. Isto foi registrado no post http://3es2ps.blogspot.com.br/2013/05/a-pequena-empresa-como-espaco.html.
Fui professor da Universidade Estadual de Londrina durante 17 anos. Entre 1981 e 1998, tive a oportunidade de ver muitas apresentações teatrais que aconteciam anualmente nas edições do FILO. Era inevitável ver a figura marcante de Nitis durante as realizações do FILO. Todavia, nunca fomos próximos. Eu admirava o trabalho que ela realizava, mas como professor do Departamento de Administração havia poucas chances de contato com ela. Ademais, minha timidez impedia uma aproximação a esta mulher forte. O que podia eu falar a alguém que fazia tanto?
Compromissos universitários acabaram nos levando a conviver, ainda que por períodos curtos. Certa vez, eu era chefe do departamento e Nitis, como vice-reitora, foi à abertura de um evento de nosso curso. Naquele dia, usei uma metáfora sobre o cinema para falar sobre o ensino de Administração. Nitis reforçou minha metáfora usando a poesia em sua fala. Foi um momento em que,juntos, misturamos razão e emoção.
Lembro-me de um encontro com Nitis, também quando era vice-reitora da UEL e eu, por apenas seis meses, fui coordenador de ensino de graduação da UEL. Este era um cargo semelhante a Pro-reitor que na estrutura administrativa da UEL tinha um nome diferente. Portanto, segundo escalão. Eu fora convidado pelo reitor Jackson Proença Testa para assumir esta função devido ao falecimento do Professor Abdo, que era o coordenador anterior. Logo no começo, certo dia, eu estava chegando para trabalhar na minha sala da CAE e Nitis me abordou no estacionamento. Veio me abraçar e dizer que estava muito feliz por minha indicação para o cargo. Ela ficara curiosa em saber quem eu era e descobrira que era irmão de Kilda. Minha irmã, também professora na UEL, auxiliava nas atividades do FILO na condição de tradutora e intérprete para os convidados estrangeiros por meio de seu domínio da lingua inglesa de que era professora. Minha curta estadia na CAE me aproximou um pouco de Nitis. Alguns anos depois, quando ela foi presidenta do Centro Cultural Teatro Guaíra, entre 2003 e 2005, eu estava em Curitiba como diretor de Administração da Fundação Araucária. Tivemos a oportunidades de nos encontrarmos algumas vezes. Caminhos idferentes, acabaram nos afastando geograficamente. Fiquei em Curitba e ela voltou para o norte do Paraná.
O empreendedorismo cultural tem me atraído recentemente. É um tema de estudo que me cativa devido ao que chamo de dupla lógica de atuação. Aquelas(es) que empreendem culturalmente, ao mesmo tempo em que seguem uma lógica criativa nas suas ações, precisam desenvolver, também, habilidades de negócios, visto que seus empreendimentos culturais estão imersos em uma sociedade capitalista e dependem de recursos financeiros. É um campo de ação onde emoção e razão convivem diuturnamente. É um processo contínuo de construção de uma identidade empreendedora, em que o sentimento de realização vem de uma capacidade de se comunicar criativamente de forma a atingir metas artísticas e viabilidade econômico-financeira.
No livro de Nitis encontrei um relato sincero em que as emoções, frustrações, alegrias, desejos, dúvidas e dívidas foram os personagens ocultos de um drama que se repete anualmente, quase sempre com final feliz. O que vi foi um relato que reforçou minha crença na noção de que o empreendedorismo, em geral, e o cultural, em particular, é uma maneira que temos de nos expressar para o mundo. Seja nos seus estágios iniciais, quando o empreendimento está se formando, seja mais tarde quando este se estabiliza, mas, paradoxalmente, demanda ajustes contínuos, algumas mudanças, inovação e transformação, os que empreendem parecem afirmar: é isso o que eu enxergo e assim que quero participar desse mundo!
Foi isto que vi Nitis fazendo, nos momentos em que pude ser espectador do FILO e lendo, nesses dias, o livro de Nitis. Para finalizar, reproduzo trecho de uma carta escrita por Nitis ao governador do estado em 1996, em que ela, a meu ver, sintetiza o que quero dizer quando a qualifico como empreendedora cultural:
"Todos os anos, inevitavelemente, sofro a angústia da imponderabilidade do acaso e da concretude dos obstáculos que configuram a incerteza de que, afinal, o Festival acontecerá mais uma vez. Choro, me lamento, rodo a baiana, chuto o pau da barraca, imagino crimes hediondos nas minhas noites de insônia... Depois, na abertura do festival, esqueço tudo e agradeço. Agradeço a deus e ao diabo..." (p. 349).
Lindo de viver!

Referência: Jacon, Nitis. Memória e Recordação Festival Internacionla de Londrina. - 40 anos. 2010.