terça-feira, 19 de maio de 2020

Tensão no Supermercado Gimenez: um assalto

Nem sempre tudo foi tranquilo no Supermercado Gimenez. Aliás, em uma pequena empresa, deve-se dizer, tranquilidade é um fenômeno pouco comum. As incertezas sobre a continuidade do negócio, as dificuldades de fluxo de caixa, pressões dos fornecedores, conflitos familiares, as visitas periódicas da fiscalização, problemas de relacionamentos entre empregados, dos patrões com os empregados, clientes insatisfeitos com algum produto ou atendimento, e assim a lista de situações que afetam a tranquilidade de um pequeno empreendimento vai crescendo. Mas, no geral, havia períodos de relativa estabilidade em que tudo corria como esperado.
Foi em um desses períodos, em que a vida corria tranquila, que passamos por um susto muito grande. Meu pai tinha um hábito que se provou perigoso. Todo dia pela manhã, de segunda a sexta, por volta das dez horas, ele pegava o dinheiro do faturamento do dia anterior, colocava em um saquinho marrom, desses que são usados ainda hoje pelo pequeno comércio, entrava no carro que ficava estacionado em frente ao prédio do supermercado e ia para os bancos. Em geral, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e Banco América do Sul. Os dois primeiros na Avenida Paraná, que depois virou o calçadão. O último na Rua Sergipe.
Andava pelo centro de Londrina com o dinheiro nesse saquinho! Só acabava quando saía do último banco a ser visitado. Nesses momentos, fazia também o pagamento das duplicatas e outros compromissos. Eram tempos anteriores à Internet! Embora o faturamento não fosse muito volumoso, eventuais necessidades de empréstimos, faziam com que o relacionamento com mais de um banco, permitisse maiores chances de negociação e obtenção de alguma condição mais favorável.
Era uma rotina! Cinco vezes por semana. O mesmo comportamento se repetia no meio da tarde. Certo dia, na saída pela manhã, uma segunda-feira, assim que meu pai saiu pela porta, um homem deu voz de assalto. Pegou o dinheiro e fugiu em um carro. A reação de meu pai foi inesperada e rápida. No mesmo momento, um freguês habitual e amigo estava estacionando em frente. Meu pai correu até o carro do freguês, entrou e falou:
_ Segue aquele carro!
Coisa de filme policial, não? Minha mãe, os empregados e empregadas do supermercado ficaram atônitos. Sem muita noção do que estava acontecendo. E sem como se comunicar com meu pai. Não havia celulares naquela época. Horas depois, meu pai chegou. Muito nervoso e contou o que tinha acontecido.
Conseguiram seguir o carro dos bandidos. Eram dois. Foram até uma casa na Vila Casoni. Meu pai e o cliente foram até a delegacia que ficava na Rua Sergipe. Levaram alguns policiais até a casa. Os policiais entraram na casa. Os ladrões fugiram. Na casa, na garagem, ficou o carro. Dentro do porta-malas do carro, meu pai encontrou a escritura de uma propriedade em uma cidade do interior de São Paulo. Trouxe com ele. Um dos policiais envolvidos era um renomado corrupto da cidade. Meu pai desconfiou de algum acerto entre ele e os bandidos, mas não pode provar nada.
Após o relato, algumas das moças que trabalhavam nos caixas, lembraram-se da figura do assaltante. Ele tinha ido várias vezes ao mercado fazer pequenas compras e ficava algum tempo de conversa mole com as moças. Estava observando os hábitos de meu pai. Felizmente, ninguém ficou ferido. Mas, meu pai teve que negociar um empréstimo com um dos bancos para fazer face aos compromissos. O dinheiro levado era de um final de semana, que sempre tinha um movimento maior. Não sei em que banco ele conseguiu as melhores condições daquela vez.
A escritura da propriedade que era de um dos bandidos, conhecido na sua cidade, foi usada em um processo para tentar reaver o fruto do roubo. Muito tempo depois, houve notícias de que um dos ladrões havia sido preso no interior de São Paulo. Um deles procurou meu pai, certa noite, em nossa casa. Foi outro susto! Minha mãe e eu também estávamos na casa. Mas, não houve violência. Ele veio negociar algo a respeito do processo.
Nesse ponto minha memória da história já não é confiável. Mas, me lembro de que havia algo relacionado à mulher do que estava preso. Ela estava em dificuldades financeiras e precisava negociar a propriedade que estava presa no processo. O que lembro é que chegaram a um acordo. Meu pai conseguiu, muito tempo depois, recuperar parte do que havia sido roubado.
Depois desse assalto, passamos a variar os horários de saída para os bancos. Lembro-me que meu pai passou a usar uma pasta de couro para carregar o faturamento e os documentos. Os saquinhos marrons foram abandonados. Eu e meus irmãos, também, passamos a fazer este trabalho. Tanto é que, certa vez, tinha ido de carro para fazer isso. Depois, voltei a pé para casa. Esqueci o carro estacionado em algum lugar do centro da cidade. A distância não era muito grande. Entre um quilômetro e meio e dois! Uma caminhada agradável. Mas, esta é outra história.

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