Quando se fala da administração de pequenas empresas
uma questão que sempre vem à tona se relaciona com sua vida curta. As
estatísticas variam, mas em geral, pode-se dizer que cerca de 80% das pequenas
empresas não conseguem completar cinco anos de vida. Assim, quando me deparo
com histórias de casos bem sucedidos que conseguem passar da casa das cinco
dezenas de existência, minha curiosidade é aguçada. O que explica esse sucesso?
Que trajetória seguiram essas empresas e as pessoas que as criaram? Como foi a
passagem de geração em geração da família que manteve a propriedade dessas
pequenas empresas? E o caso de sucessão fora da família, como se explica que
pessoas diferentes dos fundadores conseguiram manter uma pequena empresa por
tão longo tempo preservando tradições criadas por seus fundadores e gestores iniciais?
Enfim, a lista de coisas que quero saber é longa!
Esporadicamente tenho encontrado relatos de pequenas
empresas curitibanas que são longevas. Esses relatos são feitos por
jornalistas, sem nenhuma preocupação científica, com seus estilos diferenciados,
nos revelando aspectos pitorescos, mudanças que ocorreram ao longo do tempo
nessas pequenas empresas, chegando até nos detalhes de como seus produtos ou
serviços evoluíram ao longo do tempo. E me ajudando a aprofundar minha
compreensão de coisas que a literatura acadêmica conta, mas quase sempre sem
graça nenhuma.
Nos últimos meses tive a felicidade de ler alguns
desses relatos. Todos eles na Gazeta do Povo, que voltei a assinar
recentemente. Escolhi duas para ilustrar alguns aspectos da gestão de pequenas
empresas.
Uma das histórias que me chamou a atenção foi
relatada pelo colunista José Carlos Fernandes, em um texto muito agradável de
ler e intitulado“O alfaiate e sua admirável máquina do tempo” (http://www.gazetadopovo.com.br/colunistas/conteudo.phtml?tl=1&id=1236541&tit=O-alfaiate-e-sua-admiravel-maquina-do-tempo).
José Carlos conta sobre a Alfaiataria Riachuelo, que existe há 80 anos, na Rua
Riachuelo, criada por um alfaiate que morava em Ponta Grossa, como nos informa
o colunista:
“Se
olharem bem, os visitantes vão notar na parede um retrato do general Heitor Borges
de Oliveira, espécie de santo padroeiro da Alfaiataria Riachuelo. Nos idos de
1930, em Ponta Grossa, o manda-chuva encomendou do alfaiate G. Matter uma
farda. Gostou tanto que o trouxe para Curitiba. Virou febre – todos os homens
do Exército queriam se vestir com ele, que era artista e costurava por ofício,
para poder fazer o que mais lhe aprazia – pintar telas ao ar livre e pilotar
motocicletas, arrancando poeira daquele Paraná em pinheiros.”
Hoje
a pequena empresa é administrada por Osvaldo Filho, filho de Osvaldo e sobrinho
de Guilherme, filhos e sucessores do fundador da empresa. Nesse longo período a
empresa manteve-se especializada em trajes militares, mas a clientela
inicialmente restrita aos militares hoje é bem diversificada, ou como bem descreveu
José Carlos “... tão sortida quanto um pote de jujubas. Imagino o dia em que um
sargento e uma guria blindada a piercings pediram juntos ao balcão, no mesmo
tom de voz, “um coturno, por favor”. Tem também a turma do teatro,
fashionistas, seguranças carecas ...”
Outra história bacana é a da Confeitaria Blumenau
localizada na rua São Francisco que atualmente é comandada desde 1994 por Ilse Baumgart Maiochi uma simpática
senhora no vigor de seus 72 anos. Mais uma vez, quem conta a história é José
Carlos Fernandes em “Os sonhos e o
sonho de Ilse” (http://www.gazetadopovo.com.br/colunistas/conteudo.phtml?id=1140382).
Ilse foi cozinheira da Blumenau, desde 1963, quando trabalhou primeiro com a
primeira proprietária, Tecla Probst, e depois com sua sucessora Ertha Weber
como relata Rosy de Sá Cardoso em “Os segredos da Confeitaria Blumenau” (http://www.gazetadopovo.com.br/bomgourmet/conteudo.phtml?id=1223670).
Antes de Ilse comprar a empresa onde trabalhava, a Blumenau foi propriedade de
uma terceira senhora, dona Regina. Nesse caso, o que se vê é uma pequena
empresa que ao longo dos anos foi passando de mão em mão, mas Ilse, a
cozinheira, ia junto com a empresa, preservando a qualidade e sabor dos pães de
casa, strudels, bolos, sonhos e outras delícias. Hoje em dia, além dos
tradicionais doces e confeitos, Ilse criou um buffet no almoço para atender a
clientela estudantil e outros que passam pela movimentada região onde está
localizada a Confeitaria Blumenau.
Enquanto
a Alfaiataria Militar manteve-se no âmbito familiar, a Confeitaria Blumenau foi
sendo vendida. Assim, duas trajetórias diferentes levam a sucessos parecidos:
empresas com vida longa, mantendo-se pequenas e reconhecidas por serviços ou
produtos de qualidade. Além disso, algo comum pode ser encontrado nessas duas
histórias. Ambas conseguiram se adaptar às mudanças ocorridas na região onde se
localizam, conseguindo ao longo dos anos, ofertarem serviços e produtos que
atraem ainda hoje aqueles antigos clientes que desejam fazer uma viagem no
tempo de suas memórias, bem como os jovens que estudam no prédio histórico da
UFPR na Praça Santos Andrade que encontram satisfação para os desconfortos da
fome e roupas que lhes permitem construir parte de sua identidade juvenil.
Nenhum comentário:
Postar um comentário