Para Cleufe
Iniciei meu curso de graduação em
administração na Universidade Estadual de Londrina em agosto de 1977. Após ter
estudado engenharia durante um ano e meio em São José dos Campos e Física por
um semestre na UNICAMP, retornei a Londrina ao final de 1976 com o firme
propósito de procurar um novo curso. Meu desejo era fazer vestibular para um
curso de comunicação e tentar enveredar pelos estudos na área do cinema.
Desde adolescente o cinema me
atraiu fortemente. Lembro-me de comentar uma vez com meu amigo Helvécio quando retornávamos
de uma sessão vespertina de cinema:
_ Sabe o que eu acho engraçado.
Os filmes que a crítica gosta eu não gosto. O filme que eu gosto a crítica não
gosta!
Helvécio riu muito e confirmou:
_ Fernando, comigo é a mesma
coisa!
Com o passar dos anos, o hábito
de ir ao cinema foi se consolidando e, hoje em dia, muitas vezes, os críticos e
eu gostamos das mesmas coisas. Mas, de vez em quando, aquilo que gosto não
agrada alguns críticos. Mas, embora o cinema seja uma presença marcante em
minha vida, sendo até fonte de inspiração para certas interpretações minhas
sobre questões empresariais, não é minha intenção escrever sobre isso agora.
Naquele ano do retorno à casa
paterna, passados os períodos festivos e as férias, certo dia minha mãe me
perguntou:
_ Fernando, não está na hora de
preparar a viagem de volta a Campinas?
Isso ocorreu por meados de
fevereiro de 1977. Era o momento que eu temia: revelar a meus pais que não
queria continuar o curso na UNICAMP. Com o passar dos dias, como já era usual
com meus irmãos, comecei a ajudar meus pais no supermercado que tinham. Nesse ambiente
de trabalho familiar, as coisas começaram a se acalmar e algum dia tive a ideia
de fazer vestibular para o curso de administração da UEL. Fui à busca do
conhecimento que poderia me ajudar e a meus pais na administração daquela
pequena empresa.
Passados os quatro anos da
graduação, logo após a formatura, veio o convite para me tornar professor. Nos
primeiros anos, me dividia entre a empresa e a universidade. Depois acabei me
dedicando exclusivamente à universidade. Fiz mestrado, doutorado, ocupei cargos
de gestão, mas sempre procurei estudar a gestão em pequenas empresas nesse
tempo todo. Terá sido uma espécie de compensação por ter abandonado a gestão do
supermercado de meus pais? Não sei! Talvez Freud explique!
A primeira pesquisa que fiz sobre
a gestão de pequenas empresas foi feita em parceria com Cleufe Pelisson.
Durante muitos anos, os alunos de administração da UEL tinham que fazer um
estágio como conclusão do curso. Nesse estágio havia um roteiro de diagnóstico
que os alunos deviam aplicar a uma empresa. Após o diagnóstico, uma área da
empresa era escolhida para o desenvolvimento de ações administrativas sob a
supervisão de uma equipe de professores do Departamento de Administração. O meu
estágio foi na empresa de meus pais.
Conversando com a Cleufe, tivemos
a ideia de fazer uma pesquisa sobre os problemas de gestão nas pequenas
empresas de Londrina. Com essa finalidade, utilizamos os relatórios dos
estágios dos alunos de administração da UEL que totalizavam 287, em pequenas
empresas, no período de uma década, entre 1978 e 1987. Com a aprovação do
departamento, Cleufe e eu enfrentamos a tarefa de ler 141 desses relatórios e
fizemos uma lista dos problemas que eram relatados, classificando-os por setor
da empresa (Produção, Finanças, Marketing, RH, Administração Geral).
A lista era muito grande! Cleufe
e eu queríamos criar uma classificação desses problemas que fosse além das
áreas funcionais. Pensávamos bastante, trocávamos ideias, debatíamos com
colegas, mas não conseguíamos chegar a uma proposta com que nos sentíssemos
confortáveis. Um dia, cheguei para a Cleufe e falei:
_ Cleufe, acho que encontrei a
solução. Sonhei com ela!
É verdade. Na noite anterior,
havia sonhado com aquele problema que estava nos incomodando e a solução veio
com o sonho: classificar os problemas em estratégicos, administrativos e operacionais
conforme apresentado por Ansoff em seu livro “Estratégia Empresarial”. Concluímos a pesquisa, fizemos o relatório, e
uma versão resumida foi publicada na Temática, número 5, de julho de 1988, com
o título “Taxonomia dos problemas das pequenas empresas de Londrina”. A
Temática foi uma revista criada por alguns professores do Departamento de
Administração da UEL, por sugestão do Marcos Tito e, infelizmente, deixou de ser editada há alguns anos. É uma
pena!
Enfim, a vida foi passando, os
anos correndo, eu fui mudando de cidade em cidade, mas algumas coisas
permaneceram: as amizades, entre as quais a de Cleufe é muito valiosa, e o desejo
de continuar pesquisando esse intrépidos empreendedores e suas pequenas
empresas maravilhosas.
Os mais antigos devem ter
percebido a brincadeira com o título de um filme da década de 60 do século
passado, dirigido por Ken Annakin, cujo título em portugês é “Os intrépidos
homens e suas máquinas maravilhosas”. Não poderia concluir esse post sem falar
de cinema!
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